terça-feira, 29 de dezembro de 2020

A estrada

 Atenção! Esta não é uma história para crianças!



Um amigo me contou uma história muito interessante e curiosa. Um certo homem que estava muito triste e abatido, não aguentando mais a dor e a solidão que sentia, resolveu sair de casa e caminhar, mas não sabia para onde. Saiu num desespero muito grande e sem direção certa. Caminhou durante um bom tempo até que avistou uma estrada de terra. Sentando em cima de uma grande pedra, à beira da estrada estava um simpático velhinho. Pelo menos, é o que parecia!

___ Onde o Senhor vai com tanta pressa? Perguntou o velhinho.

___ Não sei! Pra algum lugar, por pressuposto! Mas não é da sua conta!

___ Claro, não queria te irritar mais que o Senhor já está! Poderia dá-lhe uma pequena sugestão? Vá pelo caminho da esquerda! É o mais curto! Mas ande um pouco mais devagar! Ha algumas pedras soltas!

O homem se assustou um pouco. Até aquele momento ele não tinha percebido que havia duas estradas. O velhinho estava na verdade, sentado entre as duas.

___ Pois bem! Vou fazer como o Senhor  pediu! Não tenho nada a perder!

E o homem continuou seu caminho, agora um pouco mais devagar. Após caminhar durante um tempo, foi percebendo algumas pedras soltas, como o velho havia dito. Quase tropeçou numa delas, mas como estava caminhando um pouco mais devagar, não caiu! Houve um momento que quase pensou em desistir e voltar, já que o tempo parecia escurecer. De repente avistou um homem que parecia estar parado logo à frente. Continuou andando até que se aproximou do tal homem, que estava todo de branco.

___ Desculpe-me, não queria assustá-lo! Para onde vai? Parece tão determinado!

___ Ando para espairecer, mais nada! Você é médico?

___ Por causa da roupa? Não, claro que não! Só achei que hoje cairia bem! 

___ Você sabe o que tem lá do outro lado? Está bem escuro por aqui!

___ Ah, sim! Um pouquinho mais pra frente fica bem mais claro! Há um lugar muito interessante por lá! Mas você deve ir um pouco mais devagar! Tenho certeza de que verá belas flores pelo caminho!

E o homem, diminuindo um pouco mais a velocidade dos passos, continuou a caminhar. Começou a observar que realmente o tempo parecia ter clareado. Conseguia ver algumas flores ao longo da estrada. Conseguia até sentir o perfume de algumas. Sentiu também, uma leve brisa tocando seu rosto. Começou a sentir-se menos irritado e até um pouquinho mais tranquilo e em paz. Olhou a seu redor e sentiu-se um pouquinho menos triste. Pensou no homem de branco por quem tinha passado e uma ponta de dúvida despontou em seu rosto. Aquele homem não me era estranho! Parecia alguém que já tinha encontrado e não havia muito tempo...mas quando? Estava no meio desses pensamentos quando avistou algo um pouco mais à frente, agachado próximo a uma grande árvore. Parecia uma criança brincando com alguma coisa nas mãos! Sim, era uma criança! Aproximou-se um pouquinho mais e por um breve momento, pareceu reconhecer alguém conhecido no rosto da criança! Mas talvez fosse apenas impressão! Resolveu aproximar um pouco mais, até quase encostar suas mãos no ombro do menino, que brincava animadamente com algumas pedrinhas coloridas no chão.

___ Oi! O que você faz aí, tão contente?

___ Estou brincando com meus diamantes! Eles não são lindos?

O homem achou muita graça, por que eram só pedrinhas coloridas! As crianças tem muita imaginação!

___Onde eu moro tem muitas dessas e outras coisas muito bonitas também! Quer ir até lá comigo? Não é muito longe! É no topo daquela montanha! Disse o alegre garotinho, apontando para uma grande montanha, um pouco mais à frente.

___ Seus pais sabem que você está um tanto longe de casa?

___ Eu sempre venho aqui pra vê se acho um amiguinho pra brincar comigo! Mas nunca vem ninguém! A não ser, o Senhor, hoje! Quer vir comigo até lá em casa? Tenho certeza de que meus pais irão gostar muito do Senhor! E o melhor é que já está quase na hora do jantar!

O homem hesitou por alguns momentos. Achou tudo aquilo muito estranho. Novamente aquela sensação de que o rosto do menino não lhe era estranho. Por um breve segundo achou que o menino parecia muito com o simpático velhinho que estava no início da estrada. Até poderiam  ser a mesma pessoa! Mas isso já seria demais! E agora , pensando nisso, até aquele moço de branco poderia ser algum parente desse garoto! Na verdade todos os três tinham praticamente a mesma feição! Não! Eu estou imaginado coisas! Que mal poderia ter em acompanhar esse simpático garotinho até em casa! 

O homem resolveu, então, seguir o garotinho. Este pegou em suas mãos e ambos seguiram em direção à montanha. A subida foi um tanto cansativa, mas o homem e a criança conseguiram escalá-la, com certa tranquilidade. No topo da montanha havia uma pequena cabana. Pela chaminé saía uma  fumaça cinzenta. Um leve cheiro de carvão estava no ar.

___ Meu pai já acendeu o fogão! Logo, logo  vai por o prato principal no fogo! O que estamos esperando? Vamos, meus pais estão aí dentro! Vamos entrar!

Falando isso, o garoto deu três pancadas na grande porta de madeira. Esta abriu-se. Ao olhar para dentro, o homem viu 3 pessoas em pé, junto a um grande fogão à lenha. Em cima do fogão havia uma grande panela de ferro. Uma faísca do fogão clareou um pouquinho mais o interior da cabana. Nesse mesmo momento, o homem assustou-se. Reconheceu o velhinho da estrada e o homem de branco. O terceiro habitante da cabana tinha uma rosto  que não parecia humano. Tentou voltar pra trás, mas foi atingido por um pedaço de pau na cabeça! Caiu inconsciente no chão da porta.

___ Onde nosso jantar pensa que vai? Disse a criança. Em suas mãos, um grande porrete feito de mogno.

 

 

 

                                       FIM

terça-feira, 22 de setembro de 2020

Dois amigos

(Atenção! Livre - sem restrições)



Olá, pensei que não viria mais!

Alguma vez eu deixei de aparecer?

Não! Não é isso! É que você nunca se atrasou! Aconteceu alguma coisa?

Não. Eu só estava um tanto relutante em vir.

Relutante? Não estou entendendo!Tem uma sujeirinha aí na sua boca!

Minha mãe fez eu tomar um pouco de mingau antes de sair...Droga, Limpou?

Sim, tá limpo! Peraí, você disse mingau? Não acredito que você ainda toma mingau! Fez vinte anos semana passada!

Nessas alturas, você já devia saber como é minha mãe! Eu sempre falo dela pra você!

Sim, quase o tempo todo!  Um de seus assuntos preferidos é falar de sua mãe!

É, pode ser!

E como toda semana, nos sentamos nesse velho banco de pedra e ficamos olhando para essa linda paisagem que há aí em frente...Linda e perigosa, já que também é um abismo! Uma queda aqui de cima seria fatal, com certeza!

Desde criança gostamos de vir aqui, não? Sempre às sextas-feiras, no finalzinho da tarde! Virou rotina! E lá se vão uns bons quinze anos! 

Alguma vez, já pensou em pular lá embaixo?

Sim, mais de uma vez! Você sabe disso!

E por que nunca pulou?

Mais uma pergunta inútil, porque você também sabe a resposta! 

Eu te impedi uma ou duas vezes! Foram momentos bem desesperadores!

E em outros, me faltou o mais importante, a coragem! Mas, me lembro que nessas ocasiões, você nem chegou a se abalar. Parecia que sabia que eu não conseguiria...

Lembra a primeira vez que nos encontramos aqui? Como o tempo voa! Já se foram 15 longos anos! Você tinha uns 5, 6 anos, não?

E por falar nisso, você nunca me disse sua idade! Na época eu deduzi que você era um ano mais velho que eu! Hoje, não tenho mais certeza...

Que importância tem isso? O que bastava pra você era saber que seu amiguinho estaria aqui sentado, esperando por você...

Sim, isso é verdade! E a gente conversou muito nesses anos todos! Você ouviu minhas alegrias e tristezas! Sorriu e também chorou comigo em vários momentos de minha vida!

Acho que nos divertimos, afinal!

O engraçado é que você nunca quis ir até minha casa! E muito menos, via você nas redondezas ou na escola! No começo, eu achei muito estranho. Pedi pro meu colega de escola, Jonas, vir comigo um dia, lembra? Eu queria que ele visse você! Queria saber se ele te conhecia de algum lugar. Pedi pra ele ficar um pouco distante, escondido. Mas ele não conseguiu te ver! Nesse dia havia um pouco de neblina. Ele me disse que eu estava sentado sozinho no banco! Imagina! Quando ele me disse isso, eu cheguei a pensar que você era uma fantasma! Na verdade, ele é que colocou essa ideia na minha cabeça!

Fantasma? Você achou que eu era um fantasma? Sim. Me lembro agora! Na semana seguinte,  você estava uma pouco com medo de mim! Chegou até a me perguntar se eu era mesmo um fantasma! Pedi pra você me tocar, lembra? Se eu fosse um fantasma você não conseguiria fazer isso!

Sim, eu te toquei! Não queria, estava com muito medo! Mas toquei em seu braço! E vi que você não era um fantasma! E acabei me acostumando. Não toquei mais nesse assunto . Jonas mudou de escola e eu nunca disse pra mais ninguém que me encontrava com um amigo misterioso! É muito menos, que não sabia nada dele, nem de onde ele era, nem mesmo o nome!

Você sempre com essa ideia fixa de saber meu nome! Nomes são só um detalhe sem a mínima importância!

Um dia, você me disse que eu poderia te chamar do jeito que eu quisesse!

E você não me deu nenhum nome ou apelido, até hoje! Por quê?

Simplesmente por que eu não preciso chamá-lo! Você está sempre aqui, me esperando, na mesma hora! Nunca se atrasou! E quando eu vou embora, algumas vezes eu olho para trás e você já não está em lugar algum...

Talvez eu seja mesmo um fantasma...

Fantasma? Há muito tempo deixei essa ideia de lado! E depois, ficamos tão amigos que o resto não teve mais nenhuma importância! Tenho um amigo excêntrico, nada mais!

Mas no fundo, o mistério ainda continua. E isso ainda mexe com você, não? Durante 15 anos, sempre às sextas-feiras, no finalzinho da tarde, nos encontramos nesse banco, no alto desse morro, ficamos olhando para esse abismo em nossa frente e conversamos! Depois que escurece, nos despedimos, você volta pra casa e eu...

E você faz o quê? Volta pra onde? São coisas que eu não sei e você nunca me contou!Por que eu nunca soube o seu nome? Por que tanto mistério? Eu não ligava antes pra isso! Claro que isso me encomodava, mas eu já estava tão acostumado com você! E tinha tantos problemas para pensar! Tinha a Aninha, por quem eu era apaixonado! Tinha a escola, a minha mãe...

Você não tinha tempo para ficar pensando nos mistérios que envolviam seu amigo confidente da montanha, não é?

Isso mesmo! Sempre fui um pouco egoísta! Foi por isso que fui deixando as coisas como estavam! Mas agora é diferente! Já está na hora de acabar com esse mistério! Hoje eu quero descobrir toda a verdade!

Nem sempre a verdade traz paz e felicidade para quem a procura!

Não importo nem um pouco com isso. Sinto que chegamos em um ponto que seria impossível continuar sem que eu saiba o porquê de tudo isso!

Saber a verdade tem um preço! Está disposto a pagar?

Dinheiro? Não acredito que é isso que você quer? Depois de todos esses  anos?

Não estou falando em dinheiro! Há coisas mais valiosas que dinheiro! E depois, seu colega Jonas podia estar certo! De repente, eu sou um fantasma!

Não! Fantasma eu sei que você não é! Eu toquei em você naquele dia!

Será que tocou mesmo? Pense bem! A gente fica aqui lado a lado conversando, mas nunca chegamos perto um do outro! Ficamos assim, um de cada lado desse banco...Sabe, naquele dia, eu estava segurando um galho. Era de uma dessas árvores aí de trás. Havia caído , lembra? Além do nevoeiro,  ventava um pouco naquele dia...

Você quer me dizer que eu toquei no galho da árvore e não em seu braço?

Estou dizendo que é bem possível, com a neblina e o medo que você sentia, é bem capaz de ter tocado, não em meu braço, mas no galho que eu estava segurando...

Não acredito! Você está querendo me dizer que é um fantasma? Essa é a verdade sobre você? Quer dizer que durante todo esse tempo eu conversei e me desabafei com um fantasma?

Estou dizendo que é uma possibilidade...mas também posso ser uma outra coisa...

Fantasmas não existem! Não posso acreditar nisso! Que outra coisa seria? Deus? ou seria algo bem pior... o Diabo?

Não seria algo assim...tão ortodoxo!

Acho que na verdade, você é só alguém solitário, que um dia quis tirar sarro da minha cara! Só que acabou gostando da minha companhia e se diverte com essa história toda!

E você não acha estranho que só você me vê? Por que você nunca me viu por aí? Por que ninguém nunca me viu? Esta é uma cidade pequena! Claro que eu poderia vir de alguma cidade vizinha, mas você acredita mesmo nisso? Eu vou um pouquinho mais além...Você sempre teve mede de descobrir a verdade! Por isso sempre procurou não pensar nisso! Aceitou a situação e pronto! Deixou o barco correr! 

É verdade! Deixei o barco correr! Mas agora, chega! Eu preciso descobrir a verdade! Nessas últimas semanas isso vem me incomodando!  Quem realmente é você? Por que apareceu na minha vida? Por que veio se sentar aqui naquela tarde? Na tarde em que minha avó morreu? Eu estava muito triste! Chorava muito! Saí de bicicleta. Ninguém me viu! Rodei sem rumo até chegar a este lugar! Vi o banco e resolvi me sentar! Foi aí que você apareceu! Sentou-se aí no outro lado  e ficou me olhando! Você perguntou por que eu estava chorando. Ficamos conversando. Quando fui embora, você me disse que estaria aqui de novo na semana seguinte. Eu gostei de saber disso! E eu voltei e continuei voltando! Eu gostei de conversar com você! E isso foi virando um hábito. Mesmo com todo esse mistério a nossa volta!

Um hábito que já dura quinze anos! É só agora você parou para refletir sobre o porquê de tudo isso? Por que só agora?

Porque eu não sou mais uma criança! É duro ter que admitir que só depois de vinte anos eu realmente amadureci! Vi isso hoje, quando minha mãe me fez tomar aquele mingau! Eu não sou mais uma criancinha que precisa de mingau! Disse isso com todas as letras  pra ela! Estou saindo de casa hoje mesmo! Vou embora dessa cidade e batalhar minha vida! Quero me tornar um homem de verdade! Vou deixar tudo isso  para trás!

E eu também ficarei para trás, não? Eu não tenho mais utilidade pra você!

Isso mesmo! Eu agradeço por ter sido meu confidente durante todos esses anos! Por ter me escutado! Mas agora, sei que não preciso mais de você! Sinto muito ter que te dizer isso! Não quero ser um mal agradecido! Mas, a verdade é que não preciso mais vir aqui toda semana, chorar minhas mágoas! E outra coisa, quero saber toda a verdade! Se você é realmente um fantasma, Deus, Diabo ou uma simplesmente um louco varrido! Eu quero saber agora!

Mas eu nãos posso dizer o que você já sabe! Você é o responsável por eu estar aqui a seu lado! Naquele tarde você precisava de um amigo! Você me trouxe até aqui!

Não estou entendendo...

Está entendendo sim! A verdade está aí, dentro de você!  Você que me fez existir! Você queria alguém para conversar e por isso eu apareci em sua vida! Eu fui a companhia que você precisava! Só você pode fazer eu sumir!

Você quer dizer que não existe? Eu que te criei na minha imaginação? Eu não posso acreditar nesse absurdo!

Mas essa é a verdade! Não era isso que você queria? Saber a verdade? Não pense que você  foi a única criança! Já estou acostumado! Cedo ou tarde, elas crescem e não precisam mais  de mim! Então, eu simplesmente saio da vida delas e sigo meu caminho até outra criança precisar de meus serviços...

Meu Deus, isso é loucura! Eu não posso ter chegado aos 20 anos tendo um amigo imaginário!

Realmente, você foi um caso inusitado! Geralmente as crianças me dispensam entre os 6, 8 anos! Algumas, um pouquinho mais tarde, mas você passou de todos os limites! Só agora parece que cresceu de verdade! Só agora amadureceu realmente! Só agora percebeu que não precisa mais de mim! 

É inacreditável! É difícil acreditar nesse absurdo! Mas..., claro! Tudo faz sentido agora!Mas, o que eu tenho que fazer? Só dizer “suma”! E você evapora?

Nada tão complicado assim! Levamte desse banco e simplesmente vá embora, sem olhar para trás! Na verdade, desde o momento em que  você amadureceu, já comecei a desaparecer! Não sei se vc já percebeu, mas meu corpo  já está ficando transparente! É melhor você ir! 

Eu sinto muito! Não queria que terminasse assim!

Não sinta! Vou te ensinar uma última lição! Na vida, tudo um dia acaba, até mesmo as  melhores coisas! Boa sorte, meu...amigo! E não olhe para trás...! Olha só! Eu também nunca soube o nome dele! Será também, por que nunca precisei chamá-lo?


                                       FIM

















quarta-feira, 2 de setembro de 2020

O Segredo de Raquel

Atenção! Esta história apresenta linguagem e situações desaconselháveis a menores de 18 anos. Conteúdo Sexual.



Oi, meu querido diário! Depois de algumas decepções amorosas, que nem vale a pena relatar aqui, resolvi que apenas uma coisa importa na minha vida. O meu prazer! E na busca desse prazer, serei capaz de fazer o que nunca tinha imaginado! Acho que posso confidenciar meu pequeno segredo pra você! Só você vai conhecer meu verdadeiro “eu”! Para todos, vou continuar sendo a “menina recatada e comportada” que todos esperam! Mas só nós dois saberemos que não é bem assim! Não vou me justificar agora, por que resolvi agir assim. Basta saber que cansei de ser usada pelos homens, que, em sua  grande maioria, só buscam aventuras e um corpinho bonito! Vou virar esse jogo! Aliás , já comecei a virar! Se prepare, meu querido diário, porque agora eu vou te contar a minha primeira aventura! Não contei antes porque precisava criar coragem! Eu sei que você é a única pessoa em quem eu posso confiar e que sabe tudo sobre mim! Mas procure entender! Eu não sou mais a mesma Raquel que você conheceu até semana passada! Hoje é quarta-feira. Faz três dias que não escrevo nada! Acho que finalmente, chegou a hora de te contar tudo!

Tudo começou na segunda-feira, pela manhã, quando resolvi sair sem calcinha. Esse será mais um de nossos segredinhos! Você sabe que preciso ir para a Faculdade logo cedo. Propositadamente eu coloquei aquela minha bluzinha branca de rendas, que valoriza bastante meus seios e aquela saia estampada de algodão. Como você também sabe, ela não é muito curta, ao contrário, chega até o joelho.___eu ainda tenho que ser a “menina comportada”, lembra?___ Porém, como já te disse antes, estava sem calcinha e isso fez toda a diferença! Um dia desses eu assisti, por acaso, na  casa da Lurdinha, aquela pornochanchada antiga da Sônia Braga, A Dama do Lotação. E foi justamente esse filme que me inspirou a fazer o que fiz naquele dia!

O ônibus estava cheio, como de costume. Sabia, também, que até chegar ao meu ponto, estaria bastante vazio. Você sabe, meu querido diário, que são quase uma hora e meia de viagem, então, eu teria tempo de sobra para me divertir! E foi o que já comecei a fazer desde que subi os degraus do ônibus.  Antes mesmo de chegar à roleta fiz questão de encostar propositadamente, minha  bundinha empinada em um senhor de terno, que estava em pé ao lado da catraca. Fiz leves movimentos de ida e vinda. Ele pareceu encostar-se um pouco mais para frente. Senti uma certa pressão e um certo “volume” que começou a crescer! Senti um misto de medo e prazer. Medo, por estar fazendo isso pela primeira vez e prazer justamente por ser também, de certa forma, perigoso. Afinal, eu estava me esfregando num completo desconhecido! 

Se algumas das minhas amigas soubessem disso iriam me “ esfolar” viva! Imagina! Ser encoxada por um estranho no ônibus? Imagino até como a Sandrinha iria dizer “ Mas você fez o motorista parar e denunciou o atrevido na hora, não foi?” Como me irrita esse “ não foi?” que a Sandrinha insiste em colocar em todo final de frase! Mal saberá ela que eu é que fui a “atrevida”! Eu não estou nem aí para movimentos feministas ou empoderamento feminino, ainda mais do jeito que pregam por aí! Meu “ empoderamento” agora é usar os homens do jeito que eu bem entender e conseguir todo o prazer que eu desejar! Ah, querido diário, se alguém ler o que eu estou escrevendo aqui, seria o escândalo dos escândalos!

Mas vamos voltar à história! Não dava para permanecer o tempo todo na frente do ônibus. As pessoas já começavam a se movimentar e a cada parada subia mais gente. Então, dei uma última esfregadimha e empinada para trás e aproveitei para perceber que o negocinho de nosso amigo de terno estava bem duro! E com a minha melhor cara de santa, passei a roleta! E logo avistei minha segunda “vitima”. Era um moreno alto, musculoso, que estava em pé do lado esquerdo, bem ao lado de uma senhora gorda, que praticamente ocupava todo o corredor. O ônibus estava realmente muito cheio e tive, então, a desculpa perfeita para parar bem em frente do rapaz e ficar, como direi, “entalada” entre o encosto do banco nas minhas costas e o morenão que também não conseguia se movimentar muito, devido à senhora gorda que estava atrás dele.

Como o tal moreno estava de calça de moletom, não pude deixar de sentir seu volume, que “se encaixou” direitinho entre minhas pernas. Não gosto nem um pouco de chamar minha virilha de buceta ou qualquer outro nome que os homens costumam apelidá-la, por isso, meu querido diário, vou passar a chamá-la com outros apelidinhos mais carinhosos e menos grosseiros.  Pois bem, encaixei minha companheira bem na frente de seu membro! Logo que começamos a nos encostar um no outro, o aumento do volume foi quase que instantâneo! Não tinha ficado molhada com o senhor de  terno, mas agora foi diferente! Só de sentir aquele volume entre a minhas pernas, fiquei toda molhadinha! Eu tremia de tesão! Sabia que não ficaria muito tempo naquela posição, porque as pessoas teriam que passar pela catraca, por isso agi mais que depressa! Comecei a fazer leves movimentos com minha barriga e consequentemente, com minha virilha. Primeiramente  levemente, depois, um pouquinho mais forte! Meu rosto estava na altura de seus ombros, então olhei para cima com os olhos mais safadinhos que pude fazer e aproveitei para passar levemente a língua sobre meus lábios, bem devagar, daquele jeito que os homens adoram! Ele correspondeu a meus movimentos com uma piscadela e com uma das mãos encaixou seu membro , que nessa altura dos acontecimentos, já estava bem duro, bem junto de minha virilha, mas ainda  por cima da saia. Que sorte eu ter escolhido essa saia de algodão! Pude senti-lo perfeitamente entre minhas pernas, ainda mais quando, com a outra mão ele abaixou um pouquinho a calça e tirou seu membro para fora! Não perdi tempo e apertei-o entre minhas pernas. Como estava com a bolsa para frente, abaixei-a um pouco  para esconder um pouco a nossa parte de baixo e também aproveitei para encostar meus seios um pouquinho acima de sua barriga. Não sei se já te contei, querido diário, mas meus biquinhos tem a mania de ficarem endurecidos ao mínimo toque e sentir a pressão daqueles músculos sobre meus seios foi a gota d’água para eles endurecerem, que chegaram a doer! Mas isso não me incomodou nem um pouco, pois eu tinha aquela coisinha dura bem onde eu queria! Imaginei que ele estaria pensando que estava dominando a situação. Mal sabia ele que era eu quem estava controlando tudo! Com uma das mãos, tirei uma camisinha da bolsa, abri com certa facilidade e discrição. Treinei essa ação por vários dias seguidos! Olhei para os lados, ninguém parecia ter percebido o que acontecia no meio das nossas pernas. Com a outra mão, desabotoei um dos botões da saia. Por isso escolhi essa saia aberta na frente com botões. Coloquei a camisinha discretamente no seu membro e aproveitando os movimentos bruscos do ônibus, que tinha acabado de pegar um desvio por uma estrada de terra, enfiei o membro viril do morenão bem na entrada de ninha vagina! Não foi difícil porque eu estava já bastante lubrificada com o tesão da situação e pelo risco de sermos descobertos. Ele me olhou um tanto assustado, porque agora ele percebeu que não dominava situação nenhuma! Mas era tarde demais! Agi rápido e com destreza e agora era só aproveitar o movimento! Queria gemer bem alto, mas não podia, Claro que isso me deixou ainda mais molhada e lubrificada! O ônibus balançava muito, o que era provincial! A cada buraco que o motorista tentava desviar, eu aproveitava para fazer movimentos regulares com a minha barriga de ida e volta e isso já estava me deixando louca! Estava tão louca de tesao que nem me importava mais se alguém tinha percebido ou não o que estava acontecendo. Já sabia de antemão que o desvio não ia durar muito e aproveitei então, cada segundo de nossos movimentos. Sim, porque agora eu fazia ele se movimentar de acordo com minha “dança”! Não demorou muito e senti que meu orgasmo se aproximava. Acelerei um pouco mais o ritmo e quase gritei de prazer! Mordi os lábios  com força e com uma das mãos, segurei a gola da sua camisa apertando-a com toda a força, enquanto meu corpo estremecia num prazer quase que frenético! Num supetão, puxei meu corpo para frente, e gritei “Que droga, motorista! Mais devagar! Quase quebrei a unha!” E fui em direção ao fundo do ônibus, empurrando de um jeito um tanto ríspido, os passageiros que estavam no corredor. Nem me importei com o estado em que ficou o tal moreno ou como ele fez para esconder o membro duro dentro de sua calça ou o que fez coma a camisinha usada! Também não me importei! Ele é homem e homens sabem se virar muito bem! 

Senti-me realizada e poderosa! Pela primeira vez, mesmo sendo mulher, dominei toda a situação! Fui dona do meu prazer. Pela primeira vez, fiz do homem, objeto! E já sabia, deste aquela momento, que aquela não seria a última vez! Consegui chegar na parte traseira  do ônibus. Uma pouco esbaforida, talvez, mas feliz! E você pensa que acabou, querido diário? Ainda não! Havia ainda uma meia hora para eu chegar à faculdade e ainda poderia me divertir um pouco mais! Como eu já sabia que o  ônibus praticamente esvaziava-se no ponto do shopping, eu pude ir para trás, tranquila. Propositadamente, me sentei no banco do meio, de modo que ficaria bem à vista de quem viesse pelo corredor para ir até a porta traseira. Faltavam ainda quatro  paradas até chegar meu ponto, então ainda tinha uma tempinho disponível. Duas mulheres que estavam sentadas no canto, se levantaram para descerem. Então, vi minha terceira “vítima”, um rapaz que trabalhava numa farmácia, que descia um ponto antes do meu e que eu já tinha visto algumas vezes nesse mesmo trajeto. Ele costumava ficar sentado nos primeiros bancos, mas, invariavelmente, passava, para um dos bancos de trás, quando o seu ponto de descida estava próximo. Foi o que ele fez. Levantou-se e começou a nadar em direção ao fundo, procurando um banco disponível. O ônibus  já estava praticamente vazio e para forçá-lo a sentar na última fileira, ao meu lado, eu simplesmente levantei um pouco a minha saia acima do joelho e abri minhas pernas. Para fazê-lo olhar em minha direção, perguntei as horas, dizendo-lhe que tinha esquecido o meu celular em casa. Aproveitei para abrir as duas mãos e colocá-la sobre o meu colo! Não deu outra, ele seguiu com os olhos o movimento de minhas mãos e não pode deixar de olhar um pouquinho para baixo e ver minha danadinha, que estava com os lábios bem abertos para ele. 

Não tem jeito, a excitação dos homens se dá, principalmente pelo aspecto visual e não foi diferente com esse. Seus olhos se abriram um pouco mais. Olhei um tanto maliciosa para ele e convidei “ senta aqui ao meu lado, seu ponto já tá quase chegando...” levantei-me e mais uma vez passei a língua pelos lábios e fui para o canto direito do ônibus, esperando que ele viesse também . Foi o que ele fez, veio e sentou-se ao meu lado. Não podia perder um minuto, assim que ele se sentou eu levantei totalmente minha saia e com as duas mãos segurei sua cabeça, assim como os homens fazem, de modo tão grosseiro com as mulheres quando querem um oral e a levei bem direto para o meio de minhas pernas! Não tive nem um mínimo de pudor para falar-lhe “ Estou molhadimha, seque-me com sua língua!” E ele imediatamente começou a passar sua língua quente, primeiro nas minhas coxas, depois entre minhas pernas, para em seguida, passar levemente sua língua sobre minha vulva e clítoris! Aquela situação, mais uma vez me deixou louca! Sentir aquela língua maravilhosa circundando a minha vulva em movimentos fortes e contínuos me deixava estremecida de prazer! Ele apertava meu clitoris com os lábios e dava uma leve chupadinha, fleccionando-o com leves movimentos para cima e para baixo. Pegou uma das mãos e começou a empurrar dois dedos  na entrada da vagina, enquanto os movimentos de sua língua continuavam, agora um tanto mais rápidos!

Olhei rapidamente para a frente e vi que já tinham  passado duas paradas. Na próxima, meu “amiguinho” iria descer! A sorte estava comigo, pois o outro único passageiro estava sentado bem na frente e conversava animadamente com o cobrador! Estavam alheios ao que acontecia no fundo . Aproveitei e pedi para ele continuar mais rápido e foi o que o danadinho fez! Ele parecia bem experiente no que estava fazendo, o que até me surpreendeu! Não demorou muito e meu segundo orgasmo do dia veio em todo o seu esplendor! Dessa vez nem procurei esconder meu gemido, deixando  meu corpo se contrair e se estremecer por inteiro! O cobrador e o passageiro olharam um tanto assustados para trás, mas o encosto do banco da frente impediu que eles vissem alguma coisa. Então, o rapaz da farmácia levantou a cabeça e disse algo sobre ter  batido com a cabeça no ferro do assento! Os dois homens nada responderam e voltaram a conversar. Nesse momento o ponto do rapaz chegou e antes de levantar perguntou meu telefone. Eu respondi que deixasse para lá, aquilo foi só uma aventura! Quem sabe alguma dia, repetiremos a dose? Ajeitei minha saia, levantei-me e fui para a frente do ônibus, junto ao cobrador, com a desculpa se ele poderia trocar algumas moedas. Enquanto isso, o rapaz da farmácia teve que descer, porque já era seu ponto.

Ah, meu querido diário, sei que você não vai me julgar e nem vai me chamar de vadia, o que as minhas amigas fariam, sem sombra de dúvida!  Só você sabe o que já passei nas mãos dos homens. Eu fui muito usada e sofri muito! Mas esse tempo passou! Agora eu quem dou as cartas! Eu é que vou usá-los! Chega de submissão! Agora você sabe meu segredo, querido diário. Em você eu posso confiar! E tem mais, eu preciso variar minhas estratégias! Por isso não vou mais repetir essa história de “ Dama do Lotação”! Por isso, hoje eu já agi de uma maneira totalmente diferente  e foi na Faculdade! Mas só vou te contar amanhã! Agora, eu preciso me preparar para ir à igreja! Para todos eu devo continuar sendo a mocinha recatada e comportada da mamãe! Mas só você e eu, querido diário, conhecemos a verdadeira Raquel!



                                       Fim



          


quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Era uma vez...

Atenção! Não é uma história infantil! Apresenta situações envolvendo conflitos psicológico-existenciais e conteúdo impactante.



Não muito longe de lugar algum, num reino bem distante e além do horizonte que despontava depois de uma grande montanha, havia uma grande floresta, em que todos os animais, sejam grandes ou pequenos, viviam tranquilos e felizes. Quer dizer, quase todos, pois entre as copas de um grande carvalho-roble, vivia uma triste coccionella, vulgarmente conhecida como joaninha, a quem todos  chamavam de  Sofia. Mas por que motivo, vocês podem perguntar, que essa pequena e graciosa joaninha era tão triste e solitária? Sofia não nasceu igual às outras joaninhas. Não era vermelhinha e de bolinhas pretinhas como as outras que viviam na floresta. Ela era branquinha como a  neve e não tinha nenhuma bolinha preta. Desde cedo foi desprezada por todos. Seus pais, quase sempre envergonhados, nada fizeram para mudar essa situação. Um dia partiram  para buscar novos suprimentos e nunca mais voltaram. Desse dia em diante, Sofia se fechou ainda mais! Deixou de frequentar a escola da professora Corujinha e evitou conversar com seu único amigo, o besouro Túlio. E desde então, vivia ali, no seu "mundinho" solitário, em sua casinha de folhas secas e de barro, que na verdade já tinha sido a casa de sua madrinha, a borbolete Suzete.

Um dia, depois de uma noite de sono um tanto agitada, Sofia amanheceu cansada de sua vida triste e resolveu que iria em busca da sua felicidade. Pediu pro mosquitinho-carteiro, não sei se falei que na floresta existia Felipe, o mosquitinho-carteiro. Ele que levava os recados e as encomendas, que não fossem muito pesadas, claro. Na hora do aperto, todos recorriam a Felipe. Era o caso agora de Sofia, que precisava falar urgentemente com seu amigo, o besouro Túlio. Por sorte, Felipe estava voando próximo ao grande carvalho quando Sofia o chamou. Logo que soube do recado, Felipe voou até onde Túlio morava, no lado leste da floresta, perto do laguinho azul, junto às mangueiras e figueiras. Não tardou muito e o próprio Túlio estava batendo à porta de Sofia. Assim que a portinha feita de raízes de manjericão se abriu, O besourinho pulou para cima da amiga repleto de saudades!
___ Pensei que nunca mais ia te ver!
___ Como sempre, cheio de exageros, Túlio!

Depois dos beijos e abraços, que quase esmagaram a pobre Sofia, esta começou a falar de seus novos planos. Contou que estava cansada de ficar presa em casa e de fingir que não ouvia os cometários maldosos sobre a sua cor. Contou também que havia tido um sonho na noite anterior. Nesse sonho ela havia ido para além da grande montanha e teria encontrado um mundo encantado, onde todos eram muito felizes e livres. Nesse reino também havia muitas ciccionelas iguais a ela e todos as admiravam por sua beleza e graciosidade.
___ Mas você não pode ir sozinha!É muito perigoso!
Depois de relutar bastante e de muita discussão, Sofia permitiu que Túlio a acompanhasse. Decidiram que sairiam na manhã seguinte, bem cedinho. E assim fizeram. Estava um pouquinho frio, então  os dois saíram bem agasalhadinhos. Usavam uma bela manta que uma velha amiga de Túlio, a aranha Margarida tinha tecido na noite anterior a pedido do amigo. Sofia fechou bem sua casinha e os dois voaram juntos do grande carvalho em direção à grande montanha.

De repente uma grande corrente de ar que vinha da direção contrária os empurrou com toda a força para trás. Por mais que tentassem não conseguiram vencê-la. Já cansados, foram jogados em direção a uma espécie de caverna, que estava meio que escondida em meio a alguns arbustos. Não impuseram resistência. Estavam muito cansados. Deixaram-se levar até a caverna e caíram exaustos no chão.
___ Estou muito cansada, Túlio! Vamos descansar aqui um pouquinho, enquanto essa ventania passa!
___ Mas é tão escura! mas eu também estou exausto! Mas vamos ficar só um pouquinho!
Foram interrompidos por um barulho bem esquisito, que parecia vir do fundo da escuridão.
___ Que foi isso? Disse Túlio assustado.
___ Que barulho medonho! Será que é um monstro?
Túlio até que ia dizer que não existiam monstros, mas era tarde demais! O barulho foi aumentando de um jeito assustador e vinha numa rapidez incrível em direção aos dois amigos. Não adiantava mais fugir! Quando deram conta um grande e assustador morcego já estava em frente aos dois!
___ Ora, ora, o que vejo aqui! Duas apetitosas quitutes pro meu almoço de logo mais!
Tanto Túlio quanto Sofia se estremeceram  de pavor! E agora? Como escapar das garras desse grande morcego? Era o fim de nossos amiguinhos?
___ Vo-você não pode nos comer! Sofia resolveu enfrentar a situação.
___ E por que não, posso saber?
___ Por que eu sou uma joaninha venenosa!
___ O quê? Essa é boa!ha ha ha!
___ Verdade verdadeira! Não está vendo a minha cor?
O grande morcego parecia ter só tamanho. Tinha uma inteligência limitada. Refletiu e refletiu por alguns instantes e então disse:
___ Então vou ficar só com seu amiguinho besouro!
___ Mas ele também está envenenado! Não vê que ele também tem manchinhas brancas? Foi por que nós estávamos brigando por um pouco de néctar de uma bela flor e aí dei-lhe uma mordida passando meu veneno. Creio que ele deve morrer a qualquer momento!
O grande morcego olhou desconfiado para o besouro Túlio. Realmente ele era preto e estava coberto por algumas manchinhas brancas. Será? Pensou coçando levemente a cabeça.Por via das dúvidas era bom não arriscar!
___ Enfim, tá bem! Tá bem! Vou deixar vocês irem!  Mas tem que ser agora! Antes que eu mude de opinião!
Túlio e Sofia não esperaram duas vezes! Resolveram ir embora logo, mesmo estando muito cansados. Como não conseguiam voar, pelo menos por enquanto, tiveram que sair da caverna andando. Saíram e nem sequer, olharam para trás.

Andaram por pelo menos uma hora. E não saíram muito do mesmo lugar. Ainda conseguiam ver a entrada da caverna. E se o grande morcego resolvesse persegui-los novamente? Afinal, ele engoliu aquela história com um pouco de má vontade. Mas se a "ficha" caísse, era bem capaz de vir vingar-se, já que fora ludibriado!
___ Acho que a ventania já passou. Estou mais descansada. Será que não é melhor a gente voltar a voar, Túlio, meu amigo?
___ Você tem razão! Estou com uma sensação estranha que estamos sendo vigiados! Será que o grande morcego percebeu que foi enganado e está só nos espreitando para dá o bote?
Olharam para cima desconfiados. Não viram nada fora do normal. Algumas borboletinhas brincavam felizes sob o olhar cuidadoso da mãe, Pulavam felizes de flor em flor num lindo pé de azaleias vermelhas.Um pouco mais acima, algumas cigarras cantavam animadas no tronco de uma mangueira. Alguns mosquitinhos voavam ao redor das mesmas, desdenhando da sua cantiga, que para eles, era muito engraçada.
___ Lá em cima tudo parece normal! Disse Sofia, procurando tranquilizar o amigo.
___ Aqui embaixo também! Pelo menos é o que parece! Respondeu Túlio, observando um grupo de formigas-cortadeiras que "trabalhavam" levando as folhas de uma pequena samambaia para dentro de uma toca.
Mesmo assim, Túlio continuava com aquela sensação de estar sendo observado. Resolveram se preparar para o voo. Assim sentiriam-se mais seguros. Mas não tiveram tempo nem de se mexerem, pois nesse exato momento, um grande sabiá-coleira apareceu do nada e com seu bico pegou nossos dois amiguinhos, levando-os para sua toca num grande pé de Jatobá. Chegando lá, largou Sofia e Túlio sobre um dos caules, próximo à entrada de sua casa.
___ Que beleza! Já tenho meus presentes de casamento para meu amigo, Bufo, o sapo-cururu do rio, que vai se casar amanhã!
___ Mas o senhor não pode fazer isso! Estamos numa grande missão!
___ Ha, ha ha! Essa é muito boa! Dois besourinhos insignificantes em uma missão!
___ Eu sou uma joaninha!
___  Ha, ha, ha! O que seria essa missão? Salvar uma pequena formiguinha perdida?
___ Não! Estamos a procura da felicidade! 
___ E onde vocês acham que vão encontrá-la, posso saber?
___ Do outro lado da grande montanha!
___ É mesmo? Ha, ha ha! 
E agora? Com certeza esse sabiá-coleira não iria cair em qualquer historiazinha! Parecia muito esperto e ria de tudo! Era bastante prepotente também, Pode ser que por esse lado, Sofia poderia tentar alguma coisa. E foi o que ela fez! Ela começou falando de sua grande inteligência e beleza e de como essas qualidades o tornaram muito famoso em mais de um reino. E de como sua cantoria doce e harmoniosa era apreciada por todos que o conheciam.
___ É verdade mesmo que vocês já ouviram falar de mim no reino de onde vieram? Quer dizer que eu, Tonico Bicudo, sou uma celebridade?
___ Claro que é, Senhor Bicudo! Graças a Deus que o palerma falou seu próprio nome por conta própria! Senão estávamos perdidos!___Pensou Sofia com seus botões!___ Quem é que nunca ouviu falar em Tonico Bicudo?
E a conversa ficou tão animada por alguns minutos que Tonico Bicudo em sua grande vaidade, nem se lembrava mais que tinha pegado os dois amiguinhos a força. Estava com o peito tão cheio de orgulho que nem titubeou quando sofia pediu que os deixassem do outro do outro lado da montanha.
___ Claro, meus amigos! Eu posso ajudá-los a atravessar o grande oceano que existe após a grande montanha!
Sofia e Túlio não sabiam que existia um oceano atrás da grande montanha e ficaram bastante admirados com essa informação. Mas como saberiam? No reino de onde vieram, ninguém que conheciam tinha ido tão longe. Todo mundo do reino se contentava em ter como limite de fronteira a grande montanha. Na verdade tinham medo do que poderia existir do outro lado. Sofia e Túlio nunca ouviram falar de alguém que tivesse ido tão longe!
___ Você nos faria esse grande favor? Perguntou Sofia esperançosa.
___ Ficaria encantado!
Então, Tonico Bicudo pegou nossos amiguinhos de novo com o bico e os levou para o outro lado. O oceano que  sobrevoavam era incrível! A cor da água lá embaixo era escura e fascinante! Sofia e Túlio nunca viram alago tão bonito! Os dois estavam maravilhados! Finalmente chegaram em terra firme. Tonico Bicudo pousou, então, numa pequena figueira, um pouco depois das margens da praia. Foi uma ótima ideia ter conseguido ludibriar  esse sabiá idiota e ainda fazê-lo voar até aqui! Refletiu Sofia. Demoraríamos tanto pra fazer o mesmo caminho com nossas azinhas pequenas. Com certeza não conseguiríamos completar o percurso!
___ Enfim, meus amiguinhos, daqui pra frente vocês devem seguir sozinhos! Nem eu conheço o que tem dentro e depois dessa densa floresta que está aí na nossa frente!
Realmente a visão que eles tinham da nova floresta que despontava depois da praia era assustadora. A floresta era mesmo muito densa. Dentro era tudo escuro. Sentiram um pouco de medo . Mas não tinha como voltar atrás. Tinham que prosseguir.
___  De qualquer forma, obrigado Tonico  Bicudo. Disse Sofia. Espero que você encontre um outro presente de casamento para seu amigo sapo!
___ Vou encontrar! Adeus! Dizendo essas palavras, Tonico Bicudo levantou as asas e saiu voando de volta por cima do grande oceano e de volta para casa. 

Era hora, então, de Sofia e Túlio continuarem sua jornada. Abriram  suas pequenas asinhas e voaram em direção à tão temida floresta. A mata era muito fechada e o sol parecia se esconder sobre as folhas. Já havia passado um bom tempo desde que entraram na floresta e ainda não tinham visto nenhum inseto ou bicho. Por isso, parecendo preocupado, Túlio disse à Sofia:
___ É muito estranho que a gente ainda não tenha visto ninguém até agora! Será que não vive ninguém nessa mata?
___ Verdade que isso também me preocupa! Não acho que isso é normal. Tem alguma coisa muito estranha nessa floresta!
Os dois amiguinhos continuaram ainda por um bom tempo voando entre as árvores e as densas folhas sem que encontrassem ninguém. Também não havia barulho de nada. Mesmo o vento que soprava era muito curto e fraco. Não fazia som algum. Tudo isso preocupavam Sofia e Túlio. A certeza de que alguma coisa estava errada foi confirmada por algo que parecia se mover lentamente pelo chão. De cima dava pra ver algo muito grande e comprido que se movimentava  por debaixo das folhas caídas. Começou-se a ouvir, então, um barulho quase imperceptível de folhas secas se movimentando. Sofia e Túlio resolveram parar de voar. Encostaram-se no tronco de um jequitibá-rosa, que era muito alto e de lá podiam observar a estranha criatura que se movia lá em baixo.
___ Que será isso, Sofia? Será perigoso? Será que pode alcançar a gente aqui em cima?
Sofia não teve tempo de responder pois a tal criatura colocou a sua grande cabeça redonda para fora. Olhou para cima, em direção a onde estava nossos amiguinhos e começou a subir com seu corpo comprido e roliço. Só aí é que Sofia e Túlio perceberem que se tratava de uma grande cobra. Mas não uma cobra comum. Era uma cobra gigante! Sua cabeça era enorme! Nem a junção de 2 grandes árvores conseguiriam escondê-la. O corpo então, nem se fala! O jequitibá-rosa em que estavam deveria ter uns 50 metros, mas mesmo assim, parecia que o corpo da cobra era ainda maior e que a sua outra parte ainda teria ficado no chão, ainda encoberta pelas folhas. Não deu tempo de fugir, a grande cobra com sua enorme boca jogou sua língua ( nem um pouquinho menor) sobre Sofia e Túlio engolindo-os.
 
                                       II

Seria o fim da jornada de nossos amiguinhos? Ainda não! Sofia e Túlio eram muito minúsculos para que a cobra gigante pudesse mastigá-los. Foram engolidos praticamente intáctos!
___ Estamos mortos? Cadê a luz? Só vejo escuro!
___ Calma, Túlio! Ainda estamos vivos! Mas estamos dentro da cobra! E precisamos sair na primeira oportunidade!
Túlio, no início, não queria acreditar, masfoi convencido por Sofia, que mostrou as “ paredes” do corpo da criatura e o porquê deles estarem se movimentando como se estivessem num carrossel. A cobra continuou seu percurso. Parecia que estava indo em direção a algum lugar. Eles precisavam sair antes que se distanciassem demais. Mas como? Porém, é nesses momentos fatídicos, quando tudo parece perdido, que os milagres acontecem, Sofia e Túlio perceberam que não estavam sozinhos. Havia outro bichinho, que assim como eles, não tinha sido mastigado. E era um besouro, assim como Túlio.
___ De onde vocês vieram? Foi perguntando o tal besouro, logo assim que apareceu, praticamente do nada!
___  Do lado de fora, ora essa! Sofia parecia indignada com a pergunta.
Os três conversaram ainda por um bom tempo. Sofia e Túlio gostaram muito de Botãozinho, como o besouro disse que se chamava. Botãozinho disse que já estava na barriga da cobra há mais de 1 dia. Tinha comido muito e como estava muito cansado, aproveitou para dormir! Disse também que morava no Reino Filhos do Sol, que ficava depois da Floresta Negra, onde agora estavam. Ele tinha desobedecido as ordens de seu rei, que não permitia que ninguém entrasse na Floresta Negra. Mas como estava muito entediado...
___ Você é muito corajoso, Botãozinho! Disse Sofia admirada.
Botãozinho  ficou todo orgulhoso com o elogio. Ainda mais por que ele disse que não ficassem preocupados por estarem dentro da barriga da cobra. Eles poderiam sair a hora que quisessem de lá! Ele possuía um pó mágico que teria o poder de levá-los para onde quisessem! Sofia e Túlio logo quiseram saber de onde vinha esse pó mágico. Botãozinho relatou que foi seu primo,Bartolomeu, que tinha conseguido o pó do Pirlimpimpim, como era chamando o tal  pó mágico, de uma boneca de pano que falava, chamada Emília. Sofia e Túlio acharam a história muito esquisita. Quase não acreditaram! Botãozinho, então, perguntou para onde eles queriam ir? Sofia lhe confidenciou que estavam à procura de um reino muito bonito que dizem que existia  depois da Floresta Negra, onde todos viviam tranquilos e felizes!Botãozinho disse que era justamente o reino sobre o qual, tinha acabado de falar e o mesmo  onde ele próprio vivia e disse que podia levá-los imediatamente!
___ Mas será  que esse pó mágico funciona mesmo? Sofia ainda estava em dúvida.
___ Se funciona? Às mil maravilhas! Vamos?
Botãozinho tirou uma pequena bolsinha que estava escondida debaixo de suas asas. Abriu um pequenino buraquimho e jogou um pouco de um pó branquinho para cima das cabeças de Sofia, Túlio e dele mesmo, ao mesmo tempo que pronunciava a todos os pulmões, uma palavra, que ele também disse ser mágica também! ___ “Pirlimpimpim!”
 De repente, eles não estavam mais dentro da cobra gigante! Estavam no meio de um lindo jardim, rodeado de margaridas coloridas, tulipas e flores, de todos os tamanhos e tonalidades. Em cima e por todos os lados, insetos  de várias espécies voavam e tagarelavam felizes! Pássaros de  cores e tamanhos diversos circulavam entre os insetos numa harmonia inacreditável! Também havia uma linda lagoa esverdeada, onde peixes de variados tamanhos e estilos nadavam e pulavam, se misturando entre si, numa espécie de dança feliz! Sofia e Túlio estavam maravilhados com aquele espetáculo da natureza! Nunca tinham visto nada tão bonito! E o que deixou Sofia mais feliz foi ver outras coccinellas de todas as cores e estilos, inclusive, brancas sem pinta, como a própria Sofia! Esta, se sentia feliz e estranhamente tranquila.
___ Aqui, todos nós vivemos em paz e harmonia! Não existem predadores ou cadeia alimentar! Todos somos amigos! Disse Botãozinho cheio de orgulho!
___ Como assim “não existe cadeia alimentar”? Como não existem predadores? Eu não estou entendendo...
Sofia estava atônita! Túlio, no entanto, não parecia surpreso. Botãozinho, no entanto, estava com semblante calmo e demonstrava serenidade.
___ Olhando bem... ___ Continuou Sofia___ acho que acabei de ver um sapo levando uma mosca nas costas e os dois pareciam conversar animadamente e...peraí, agora uma cobra cascavel que acaba de sair de dentro do lagoa se juntou aos dois! Mas isso é impossível!
____ No mundo do qual você veio,  isso realmente seria impossível, mas não “neste mundo”...
___ O que você quer dizer com “neste mundo”? Sofia perguntou curiosa!
___ Olha, minha querida! Não era pra você saber da situação assim, desse jeito tão...rápido! Eu estava encarregado de prepará-lá
___ Situação? Mais uma vez Sofia perguntou curiosa!
___ Minha querida Sofia, minha filha! Quando eu terminar de lhe contar, você compreenderá tudo!
___ Filha? Sofia não podia acreditar, mas não era mais com Botãozinho que ela estava falando! Quem estava na sua frente era seu próprio pai! Ao se virar para Túlio, Sofia teve outra grande surpresa! Túlio não estav mais ali, mas sim, sua mãe, Augusta! Na verdade Sofia estava diante de seus pais, Josué e Augusta!
___ Mas, o que está acontecendo?
___ Você está no Paraíso dos Animais, minha filha!
___ Eu morri, papai? Vocês também morreram?
___ Sim, minha querida!
___ Quando? Ah, claro, a cobra gigante...
___ Não, meu bem! Você morreu de tristeza, enquanto dormia!
___ Mas, então, cadê Túlio, meu amigo? Viemos juntos e passamos por cada uma no caminho...
___ Seu amigo Túlio não te acompanhou, minha querida! Se bem que foi ele que encontrou seu corpinho sem vida no outro dia, pela manhã! Quem estava te acompanhando nessa sua “travessia” era sua mãe, que estava transformada em seu melhor amigo! Tudo isso foi feito para que você pudesse fazer sua “viagem” de forma mais tranquila possível e que pudesse compreender sua verdadeira situação. Foi uma espécie de ritual de passagem. Você não poderia simplesmente aparecer aqui e saber de supetão que tinha morrido! Seria um choque muito grande! Por isso, nós, que somos seus pais e a amamos muito, ficamos encarregados dessa tarefa! Aliás, todos nós temos uma tarefa a cumprir, não só nas nossas vidas, como também aqui, onde estamos!
___ Quando vocês morrreram? Depois que me abandonaram?
___ Não te abandonamos, minha querida! Agora quem falava era D. Augusta, mãe de Sofia ___ Tínhamos saído para buscar suprimentos , como você já sabia. Mas no caminho de volta, um pássaro faminto nos engoliu! Não tivemos tempo de fazer nada! E depois ficamos muito preocupados com você! Só depois de algum tempo que chegamos aqui é que compreendemos o que realmente aconteceu conosco! Sentíamos muito culpados por permitirmos durante muito tempo, que os outros insetos caçoassem de você e de sua cor!  A verdade é que naquele reino em que vivíamos, quase todos eram invejosos e ignorantes! Não sabiam, por exemplo, que existiam espécies variadas de coccionellas, de todas as cores, inclusive branquinhas como você! Na verdade, eles zoavam você, por que você era diferente! É isso também não era motivo pra você ficar triste! Também fomos culpados por não agirmos e por ficarmos calados. Deveríamos ter apoiado você! Deveríamos ter mostrado o quanto você é especial e o quanto te amávamos!
___ Eu não queria que tudo terminasse assim! Mas eu fiquei muito triste e sozinha quando vocês não voltaram! Pensei que tinham me abandonado! 
___ Tudo isso, nós compreendemos, minha filha!
___ E o Túlio, meu melhor amigo, eu tenho que dá um jeito de falar pra ele não ficar triste com minha partida! Ele vai sofrer! Minha madrinha também! Ela ficou de me visitar em alguns dias. Mamãe, temos que avisá-los que estamos bem!
___ Isso não será possível, minha querida! Lembra daquela história que eu te contava quando você era pequenininha?
___ A história que tinha num grande livro preto, que você ouviu de uma mãe humana que estava lendo para sua filhinha? Você estava na janela do quarto da menina e nunca esqueceu essa história!
___ Sim, a história do Rico e Lázaro. Depois que os dois morreram e o Rico estava sofrendo no lado tenebroso, viu Lázaro do outro lado com um tal de Abraão, pediu para que pudesse ir até eles, para que Lázaro, pudesse molhar sua língua, já que estava com sede. Porém, Abraão disse que havia um grande abismo entre os dois mundos e seria impossível um atravessar de um lado para o outro, mesmo que quisessem! Pois aqui é a mesma coisa, minha querida! Não podemos mandar nenhum recado para quem está do outro lado! Temos que confiar que Túlio e sua madrinha compreendam por conta própria o grande ministério da vida! E que consigam superar da melhor maneira possível todos os problemas que a vida lhes apresentar!
___ Coisa que eu não consegui fazer, mamãe! Eu deveria ter saído da cama! Eu deveria ter deixado meu amigo Túlio conversar comigo! Todo dia ele ia bater na minha porta para falar comigo e eu não lhe dava atenção! Pedia pra ele ir embora! Eu tinha que ter reagido! Eu deveria não ter abaixado minha cabeça toda vez que falavam da minha cor ou por que eu não tinha bolinhas pretas, como as outras coccionellas! Eu deveria ter tido orgulho de ser diferente! Levantado a minha cabeça e ter seguido em frente! Mas fui muito fraca e covarde! Me deixei levar pelo que os outros insetos diziam! E acabei desperdiçando minha vida! Bem que poderia ser verdade a história do pó do Pirlimpimpim! Agora que me lembro...
___ Sim, essa história foi outra que ouvi da boca da mãe daquela menininha! Eu adorava ir todo dia naquela janela, só para ouvir aquelas histórias! Mas quem disse para você que tudo terminou? Apenas uma etapa teve fim! Aqui o tempo é visto de uma outra forma! Você vai começar agora, uma nova fase da sua viagem! Venha conosco, minha filha, você ainda tem muita coisa a conhecer...
Sofia pediu pra ficar um pouco sozinha. Seus pais então permitiram. Era realmente muita coisa para sua cabecinha! Voaram em direção ao horizonte onde vários outros insetos e pássaros também seguiam. Sofia sentou-se numa pequena folha de jabuticaba que estava caída sobre a relva e começou a penar no seu amigo Túlio. “Espero que você me perdoe, meu grande amigo! Como me arrependo de não ter permitido que você me ajudasse! Que você não fique triste por eu ter partido! Quero muito que você encontre um outro amigo e que vocês possam fazer muitas coisas juntos! Espero que também não liguem muito para o que os outros vão pensar ou dizer! Vivam a vida do jeito que acharem melhor! Não prejudiquem os outros, também! A vida é tão boa e também tão curta!  Não dá pra gente ficar  com mesquinharias! A felicidade não está em lugar algum! Só agora percebi que ela estava sempre comigo! O tempo todo, eu carreguei a felicidade dentro do meu coração e não sabia! Ah. Se eu tivesse sabido disso antes! Sejam felizes agora, enquanto ainda dá tempo! Seja feliz, meu amigo Túlio!
E Sofia levantou-se e também voou com firmeza, em direção ao horizonte! Pensou por um momento em olhar para trás, mas logo desistiu! O que passou, passou! Não tinha mais como consertar! Quem sabe, seu amigo Túlio não teria uma sorte melhor? Ele poderia ser muito feliz lá mesmo onde ele está! Será que ele olhará para seu coração? Pena que só agora eu olhei, mas tenho certeza de que com o meu querido Túlio será diferente! Ele sempre foi tão curioso! E sentindo-se feliz, Sofia continuou voando, até desaparecer por entre algumas nuvens no céu.


                                 Fim

Ofereço essa história a meu grande amigo Gustavo Ximenes, que um dia, numa conversa calorosa sobre assuntos filosóficos e também religiosos, discutimos um pouco sobre a parábola bíblica O Rico e Lázaro. Naquele momento, dicidi que um dia escreveria uma história em que, de certa forma eu pudesse relacioná-la com essa parábola. Aí está, a história foi escrita. Espero que tenham gostado! Mas mesmo que não, fica pelo menos, a reflexão!

             Carlos Oliveira 
























___ 

domingo, 28 de junho de 2020

O Mistério da Estrada 14

Era uma tarde um tanto abafada de verão. Mr. Rudolf Vilasboas, como gostava de ser chamado, estava escrevendo uma carta. Não que ele fizesse isso com frequência. Em sua suntuosa mansão, sentado em frente a sua velha escrivaninha, no pequeno Vilarejo de Santa Bárbara, interior de Águas Belas, Mr. Rodolf sempre se sentia como um verdadeiro Lord inglês, o que era justificado por sua descendência inglesa, por parte de seus bisavós paternos, que "colonizaram" a região há mais de 100 anos. Se alguém, por ventura, passasse agora em frente à pequena janela conjugada de seu escritório, uma suposição um tanto remota de ocorrer, veria um simpático senhor, de aproximadamente 70 anos, sentado junto a uma velha escrivaninha de mogno, corpo ainda esguio (ele tinha sido atleta quando jovem), cabelos grisalhos, escrevendo arduamente algo em um bloquinho de papel. Veria seu semblante um tanto preocupado e sisudo, piscando o olho direito quase sem parar, gesto que ele não conseguia evitar quando estava nervoso. Veria também seu olhar, que à primeira vista pareceria distante, mas que na verdade era bem astuto.

Nesse momento, algo fora da rotina aconteceu. A porta de vidro que separa o escritório da grande varanda, que circunda a  grande mansão, abriu e por ela entrou uma pessoa que parecia ter vindo de um dos lados. Nas mãos, empunhava uma pequena arma. Foi diretamente em direção à escrivaninha, onde estava Mr. Rodolf. Não demorou muito para que o barulho de um tiro ecoasse por toda a Mansão Sun Way.

Suzane VilasBoas penteava seus belos cabelos ruivos. Estava indignada. Olhava para o grande espelho a sua frente com um certo olhar de fúria. Sentada em frente à penteadeira cheia de cosméticos, perfumes e uma caixinha de jóias, parecia uma rainha que tinha acabado de ser contrariada. Que velho mais sovina! Me enganou descaradamente! Assim que casarmos, querida, iremos viver em um de meus enormes apartamentos em Londres ou mesmo Nova Iorque. Pois, sim! Já faz 3 meses que nos casamos e eu ainda estou estacionada aqui nesse fim de mundo! Será que ele não percebe que preciso de movimento? Que preciso de festas? Que preciso ser vista? Não aguento nem mais um dia nesse mausoléu! Hoje mesmo vou falar pra ele, ou vamos imediatamente para Londres ou Nova Iorque ou eu não respondo por mim! Eu realmente sou uma grande atriz. Ele vai ficar bastante satisfeito com meu desempenho...

Edgar Vilasboas e sua esposa, Cleuza conversavam em uma das mais aconchegantes suítes da Mansão Sun Way:
___ Eu não duvido nada que aquela sirigaita esteja fazendo direitinho a cabeça de seu pai, querido!
___ Você está sendo muito leviana, minha querida. Ela parece realmente gostar muito dele!
___ Vocês homens são todos iguais! Caem de quatro ao verem um rostinho e corpo bonitos...
___ Papai não é um tolo e nunca foi, querida!
___ Os homens, depois de uma certa idade, se tornam tolos, meu bem, e são facilmente enganados por um belo rosto!
___ Papai não seria tão idiota assim!
___ Eu sei o que estou falando, querido, eu escutei ele hoje chamando o advogado!
___ O que você esta falando?
___ Eu estava admirando aquele lindo jardim de Tulipas, próximo à janela do escritório. Não pude evitar de ouvir o seu pai ao telefone. Você sabe como ele fala alto. Escutei claramente quando ele chamou o advogado para jantar hoje à noite.
___ Não acredito que papai irá tomar alguma decisão que prejudique a mim ou a Tereza. Pode ser que tome em relação a João Vítor, que é um total irresponsável!
___ Eu não teria tanta certeza disso, querido! Lembre-se que mês passado ele já disse com todas as letras que não vai mais te socorrer com grandes quantias toda vez que você der os pés pelas mãos! Nem a você e muito menos ao desastroso marido de sua bela irmã!
___ Eu não tive muita sorte nos meus últimos investimentos. Só estamos passando por uma fase ruim! Quanto ao Douglas, realmente minha irmã fez um péssimo negócio casando-se com um falido!
___ E tem mais, querido... Eu escutei quando ele perguntou se poderia deixar toda sua fortuna para uma única pessoa...

Será que ele descobriu  tudo? Como ele descobriu? Velho desgraçado! Eu estava escondendo tudo tão bem! Tive todo o cuidado necessário. Ninguém desconfiou de nada! E Agora? Eu tenho que agir rápido! Não posso falhar! Hoje ele me olhou de um jeito tão estranho! Tive certeza na hora que ele havia me descoberto! Tenho que dá um jeito nisso! Não me resta outra alternativa...

Rodrigo Serrano agora tinha certeza de que estava perdido. Já estava rodando sem rumo há um tempão. Maldita hora em que resolveu seguir a orientação daquele simpático frentista. Há um atalho fantástico à esquerda da avenida! Você economizará tempo e combustível! E agora nem sei mais onde está a autoestrada! Mas o pior ainda estava por vir. Sem motivo aparente algum, os dois pneus laterais estouraram ao passarem por cima do que parecia uma lombada. Droga! Só me faltava essa! O que eu farei agora, meu Deus? De repente ele avistou à esquerda da estradinha em que estava, uma suntuosa casa  cercada de altos pinheiros. Já eram quase 7 da noite. Quem sabe os moradores podem me ajudar? Resolveu contornar, mesmo com o carro naquela situação, em direção à bela casa. Estacionou seu velho Uno amarelo, no que parecia um estacionamento, ao lado de uma linda Mercedes e de uma enorme placa de madeira, que dizia de um modo um tanto pomposo demais: Mansão Sun Way, propriedade dos VilasBoas desde 1889. Estrada  14, nº 574. Segurou um pouco o riso. Ora, ora, pensei que estava perdido e vim parar logo onde eu realmente queria! Antes de chegar até a porta ele precisava fazer algo. Um tempo depois, tocou a campainha.

Tereza VilasBoas era uma bela morena de olhos verdes. Tinha 35 anos de idade, mas parecia muito bem ter uns 21. Era alta, magra e muito charmosa. Nesse momento, seu marido, Douglas, estava admirando seu belo traseiro, enquanto Teresa estava terminando de se trocar para o jantar.
___ Não fique ai sentado feito um bobo na cama me olhando, Douglas, querido. Me ajude a abotoar esse vestido! Você sabe que papai não admite atrasos para o jantar!
___ Eu estava aqui dizendo pra mim mesmo, querida. Que sorte eu tive em ter me casado com você!
___ Eu sei, Douglas, querido! Você teve mesmo muita sorte! Só não sei se posso dizer o mesmo!
___ Querida! Não fale assim! Você sabe que eu era muito rico quando me casei com você!
___ Sim, era o que você dizia...Mas de uma hora pra outra, sua família perdeu tudo!
___ Mas já te expliquei isso tantas vezes, meu amor! Aliás, desde quando nos casamos há 3 meses...
___ Sim, tivemos sorte que papai também estava se casando na mesma época! Ele pareceu nem se importar! Mas agora, querido, ele já me interpelou mais de uma vez em relação ao nosso casamento! Está cada vez mais difícil segurar as intenções dele, Douglas!
___ Eu sei que você vai dá um jeito, querida...

João Vítor sempre foi o ovelha negra da família. Desde criança sempre se mostrou uma pessoa um tanto desonesta. Colava nas provas, mentia para os professores e coleguinhas. Sua mãe, a Senhora Maria Vilasboas, sempre era chamada à diretoria para resolver as mais variadas situações. Quando finalmente cresceu a situação não melhorou em nada. Ao contrário, parece ter piorado! A gota dágua foi quando falsificou a assinatura do pai em um cheque. Mr. Rudolf ficou furioso e resolveu mandar o filho para estudar num internato na Europa. Lá ele ficou até completar os estudos. Cursou a faculdade de administração. Mas quem disse que não aprontou nada? Mais de uma vez, seu pai também teve que intervir em favor do filho e mais de uma vez, evitou que o filho fosse preso. E agora, com quase 30 anos e nem um pingo de maturidade, o filho retorna a velha mansão da família. Sentado em seu quarto, João Vítor estava pensativo. O que será que todos estão pensando a meu respeito? Sabe de uma coisa? Eu não ligo a mínima! Nunca liguei! Eles terão que me engolir! Até o Edgar, com aquele ar de dignidade e arrogância! Somente Tereza  estará feliz por eu ter voltado! Ela sempre gostou de mim! Talvez a única, depois de minha mãe! Mamãe... por que você se foi? Papai foi o responsável por ela ter morrido tão cedo! Sim, ele foi o culpado! Ele e suas amantes! Mamãe morreu de desgosto! Um dia eu me vingo de verdade desse velho desgraçado!

O barulho do tiro fez todos correrem para a porta do escritório de Mr. Rudolf. A primeira a chegar foi Catarina, a  empregada mais antiga da Mansão Sun Way. Era uma espécie de governanta, responsável pela casa e pelos outros empregados. Depois dela, os outros chegaram, praticamente juntos, vindo de todos os lados.

___ O que aconteceu Catarina? Cleuza foi a primeira a abrir a boca.
___ Eu não sei, Senhora. Eu acho que foi um tiro e veio aí de dentro!
___ Não! Papai! Edgar gritou se dirigindo em direção a porta, tentando abri-la. Não quer abrir! Está trancada!
___ Será que o velho se matou?
___  Não fale asneiras, João Vítor! Papai não faria uma coisa dessas! Douglas parecia transtornado.
___ Eu tenho uma chave reserva! Dizendo isso, Catarina tira um molho de chaves do bolso. Procura uma em particular e abre a porta. Todos entram ao mesmo tempo, empurrando uns aos outros. Susane consegue entrar primeiro. Ao ver o corpo do marido sentado na cadeira, com a cabeça jogada sobre a escrivaninha, gritou estridentemente e caiu desmaiada, convenientemente num dos sofás.
___ Meu Deus! Teresa gritou com desespero. Será que foi um assalto!
___ O que está acontecendo aqui? Todos olharam com ar assustado para Rodrigo Serrano, que nesse momento entrava no escritório, vindo por trás de todos, diretamente da sala de estar.

                                                                        II

___ Quem é você? Edgar foi o primeiro a tomar conta da situação.
___ Meu nome é Rodrigo Serrano. Estava justamente tocando a campainha quando ouvi algo que parecia um  tiro. Toquei mais umas duas vezes. Ninguém parecia ter ouvido, quando ia tocar novamente eu escutei um grito horrível de mulher, aí não teve jeito, vi que alguém precisava de ajuda, vi que a porta não estava trancada e resolvi entrar. Vi a maioria descendo as escadas em desespero em direção a esta sala e resolvi segui-los.
___ Isso é verdade, Senhorzinho Edgar. Disse  Jonas, o copeiro, segurando uma bandeja vazia de prata, chegando nesse momento, criando uma sensação de anticlímax em todos.
___ Jonas, o que você faz com essa bandeja nas mãos?
___ Desculpe-me Senhora. Disse se dirigindo a Cleuza Vilasboas. mas estava polindo a prataria quando ouvi a campainha tocar. Já ia atender à porta, quando ouvi o tiro. Fiquei paralisado! Por alguns instantes não conseguia me mexer! Vi quando esse cavalheiro em questão entrou depois do grito de madame Susane. Consegui me recompor do choque e vim por trás dele, seguindo-o até aqui.
___ Sim, tudo muito bem explicado! Mas, o mais importante o senhor...
___ Rodrigo Serrano.
___ O senhor, Rodrigo Serrano, ainda não disse! O que está fazendo aqui? Por que tocou a campainha desta casa?
___ Eu acho que haverá tempo para explicações, mas neste exato momento, precisamos verificar qual o estado da vítima! Será que não está somente ferida? Eu preciso averiguar...
___ Você é médico ou algo assim?
___ Sou estudante do quinto ano de medicina. Tenho certeza de que posso verificar o estado em que se encontra a vítima de arma de fogo. Se não se importa, gostaria de examiná-lo!
___ Nas histórias de detetive, sempre é lembrado que não se pode mexer no corpo de uma vítima de assassinato!
___ Não seja tolo, João Vítor, não vê que papai cometeu suicídio!
___ Ah, minha Tereza querida, agora quem está sendo tola é você!
___ Não pode ter sido suicídio! Disse Rodrigo Serrano. Por 2 motivos!O tiro foi dado à queima roupa, por trás, na nuca, num ângulo que seria quase impossível que a vítima pudesse ter feito nela mesma. Mesmo que não fosse canhota e contorcesse a mão!
___ Como sabe que meu sogro era canhoto? Cleuza parecia um tanto incrédula.
___ Ora, ele está segurando uma caneta com a mão esquerda e parece que ia escrever algo nesse bloquinho de papel...
___ Você é muito observador, Senhor Rodrigo Serrano, não vai dizer que também é da polícia?
___ Não, claro que não. mas eu tenho um tio Inspetor de Polícia. E nas horas vagas, costumo ler histórias de detetive. É meu hobby na verdade, Senhor...
___ João Vítor Vilasboas. Sou o filho mais novo do Senhor Rudolf Vilasboas, a vítima que você acabou de examinar!
___ Bem Senhor Serrano. Eu sou Edgar VilasBoas, o filho mais velho. Esta é minha esposa, Cleuza. Aqui a meu lado está Tereza Vilasboas, minha irmã e seu marido, Douglas.
___ Gostaria de expressar meus sentimentos pela perda repentina e dizer que sinto muito!
___ Senhor Serrano, você ainda não disse o segundo motivo.
___ Não, D. Cleuza, ainda não disse.

Nesse momento Suzane, que estava repousando no sofá, no canto do escritório, começou a despertar de seu desmaio. Levantou a cabeça e ainda uma tanto tonta, fez uma pergunta que desconcertou a todos.
___ Então, já chamaram a polícia?
___ Po-polícia? Por que a polícia? Eu não quero me envolver com polícia! Jonas, o copeiro, pareceu assustado.
___ Por que este cavalheiro acaba de deixar por entender que papai foi assassinado!
___ Cleuza, querida! Tenho certeza de que ele não quis dizer exatamente isso...
___ Sinto muito, Senhor Edgar, mas creio que não me resta dúvida de que foi assassinato! E a polícia dirá o mesmo! Rodrigo Serrano parecia bastante convicto.
___ Deus, Isso não pode está acontecendo! Em nossa família?
___ Calma, Tereza! Acho que talvez tenha sido um acidente...
___ Ora, João Vítor, como isso seria possível?
Douglas Vilasboas resolveu intervir:
___  O que eu acho realmente estranho foi que o meu sogro foi morto justamente na mesma hora que esse Senhor, Rodrigo Serrano, entrou nesta casa... Acho até conveniente demais!
___ Mas eu já expliquei os motivos que me levaram a chegar a esta casa!
___ Muito provincial, não? Douglas continuou incisivo
___ E além do mais, o seu copeiro pode confirmar que quando se ouviu o tiro, eu estava tocando a campainha, em frente à porta da sala! Não seria possível eu estar nesta sala a mesma hora atirando em seu sogro!
___ Jonas, vem cá! Edgar Vilasboas grita em direção ao copeiro, que estava, ainda visivelmente, assutado, ao fundo da sala, meio distante de todos.
___ Pois não, Senhorzinho! Disse Jonas, se aproximando.
___ É realmente verdade isso que ele está dizendo?
___ Si-sim, Senhorzinho! O Senhor Serrano tocou a campainha quase no mesmo momento em que ouvi o tiro. Foi por isso, Senhorzinho, que fiquei paralisado! Eu não podia acreditar, depois desses anos todos trabalhando para Mr. Rudolf, que ouviria um tiro dentro desta casa! O Senhor Serrano tornou  a tocar mais um ou duas vezes, Depois vi todos descerem e irem em direção ao escritório. Vi quando o Senhor Serrano começou a seguir em direção a esta sala, Só então, eu despeitei da minha espécie de transe e também vim em direção ao escritório.
___  Nesse caso, só nos resta chamar a polícia! Rodrigo Serrano resolveu tomar conta da situação.
___ E também porque eu preciso mostrar que não tenho nada a ver com isso. Cheguei a esta casa por mera coincidência. E por outra infeliz coincidência, me vi envolvido em um assassinato! Eu preciso livrar a minha cara!
___ Só que tem um grande problema! Suzane, que estava esse tempo todo deitada no sofá, resolveu se levantar e dá uma notícia que ninguém esperava.
___ O telefone não está funcionando! Desde essa manhã, na verdade. Eu iria trocar o horário do cabeleireiro e não consegui falar com ninguém!
___ Eu não acredito nisso! Tereza se indignou. ___ Estamos quase nos anos 90 e esses telefones ainda estão no século XIX!
___ Acho que podemos pedir para o jardineiro ir até o Distrito Policial. Fica a uns 30 km. De qualquer forma é mais perto que ir até nosso vizinho mais próximo! Falando isso, Cleuza saiu da sala.
___ Precisamos sair desta sala e trancá-la. Nada pode ser mexido.Tudo tem que estar do jeito que encontramos. Rodrigo Serrano mais vez demonstrando que tomaria conta de tudo até que a polícia chegasse. Tem alguma outra sala para onde nós todos possamos ir?
___ Temos a biblioteca, disse Cataria,a governanta. Lá haverá espaço suficiente para todos. Há dois grandes sofás,algumas mesas e cadeiras. Quanto a fechar esta sala eu mesma posso fazer isso, assim que sairmos daqui!
___ Eu quero todas as cópias das chaves existentes dessa sala. Elas devem ficar em lugar seguro até a chegada da polícia.
___ Você não acha que estas chaves devem ficar com alguém da família? Comigo, por exemplo, que sou o filho mais velho? Edgar parecia aborrecido com a intromissão de Serrano naquilo que ele julgava ser um assunto para a família resolver.
___ Podemos deixar as chaves a vista de todos, em algum lugar da biblioteca. Assim, ninguém poderá pegá-las sem ser visto e ficarão seguras até a chegada da polícia. Todos pareceram concordar com essa ideia.
       João Vítor, depois de olhar para o corpo de seu velho pai, que continuava caído sobre a escrivaninha, perguntou desviando seus olhos para Rodrigo Serrano.
___ Você disse que tinha dois motivos para não ter sido suicídio, qual o outro?
___  É bem simples: A arma que matou seu pai não está em suas mãos, nem em cima da escrivaninha, muito menos no chão! A arma não está nesta sala!
___ Eu não teria tanta certeza! Nesse momento, Cleuza entra um tanto esbaforida na biblioteca.
___ O que foi que aconteceu, Cleuza, querida? Parece que viu um fantasma! Edgar transparecia preocupação com a esposa.
___ Eu consegui falar com nosso jardineiro, Jairo, que já é um senhor de certa idade, Senhor Serrano. Ele tinha acabado de chegar de sua caminhada diária de fim de tarde. Achei melhor que ele fosse no carro de meu sogro, já que seria mais rápido...
___ E qual o problema disso, minha querida?
___ É que alguém deve ter mexido no carro de seu pai, querido! Por que cortaram alguns fios do motor! Eu fiquei muito assustada! O Senhor Jairo então, resolveu ir a pé. O velho carro dele está na oficina do velho Thomas, na cidade, desde a semana passada!
___ Meu Deus, Mas o que significa isso?
___ Significa, que o assassinato de seu pai, Senhor Edgar, foi premeditado!

                                                                          III

Depois do susto inicial por causa das declarações de Cleuza Vilasboas, todos resolveram que seria melhor irem para a biblioteca. O escritório foi trancado, inclusive todas as janelas e a porta envidraçada. As chaves foram penduradas num prego na parede de entrada da biblioteca, bem a vista de todos. Catarina providenciou algumas bebidas e  sanduíches. Suzane Vilasboas sentou-se numa confortável poltrona, que ficava ao fundo. Cleuza e Edgar Vilasboas sentaram num belo sofá de dois lugares, que ficava ao lado direito, junto a uma grande janela. Tereza e Douglas Vilasboas ficaram acomodados numa pequena mesa redonda, ao lado de Suzane. João Vítor, como sempre, deslocado, estava em pé, ao lado da janela. Os empregados da casa se acomodaram no grande sofá à esquerda. Lá sentaram-se o velho copeiro Jonas, a cozinheira, Maria, a arrumadeira Clotilde e Catariana, a governanta. Rodrigo Serrano, que nessa altura dos acontecimentos, se sentia o próprio  detetive belga Hercule Poirot, das histórias de Agatha Christie, estava sentado ao centro, numa grande cadeira rotativa preta e de encosto alto.
___ Bem, acho que estamos prontos!
Antes de começar a conversar, enquanto todos ainda se acomodavam, Serrano resolveu avaliar cada um dos presentes, parando um pouco em cada um, em particular. Começou com a nova esposa de Mr. Rudolf, Suzane Vilasboas. Sim, uma bela mulher. Loira, alta, corpo bem feito...um tanto "burra", talvez, ou se faz? Difícil dizer assim, sem conhecer melhor. Casou-se por dinheiro? Isso não tenho duvidas! Cheia de jóias, um tanto espalhafatosa. Esse tipo não me engana! Vende a própria mãe por dinheiro!

Tereza Vilasboas. Esta sim é uma mulher de classe! Difícil imaginar o que ela está pesando! Muito autocontrole. Parece devotada ao marido, que parece comer na sua mão! Por falar nisso, seu marido, Edgar Vilasboas parece preocupado com alguma coisa. Será com o quê? Será que as coisas não andam bem para os dois? Preciso descobrir, pode ter algo aí que seja importante!

Edgar Vilasboas. O filho mais velho. Um tanto impulsivo. Um tipo nervoso. Parece preocupado com morte do pai, mas pode muito bem ser fingimento. Sua esposa, Cleuza, parece um doce! Educada, competente e de iniciativa. Tende a dominar facilmente o marido, pelo que entendi. Mesmo assim, tem algo aí que não encaixa...preciso descobrir o que é!

João Vítor o deslocado da família! O estorvo! Ali em pé, parecendo perdido. Chega a dá pena. Um incompreendido ou um malandro de marca maior? Ouvi dizer que fez algumas coisas nada honestas, não só em criança como depois de adulto. Será também um assassino? Com certeza seria um alívio para a família se fosse ele! Só tenho certeza de uma coisa. Ele sabe algo. Só não sei se o que ele sabe é importante ou não. Preciso descobrir.

Catarina, a governanta. Mulher competente demais para o meu gosto. Parece uma professora durona que tive! Com esses cabelos pretos amarrados nesse coque e esses óculos grandes. Parece bem mais velha. Quantos anos? Aparenta uns 40. Mas se soltasse esses cabelos e vestisse algo decente, não essa saia horrorosa e essa blusa de vovó, passaria por uma bela moça de 25 anos numa boa! Será que sabe de alguma coisa? Com certeza sabe de tudo! Mas como vou arrancar algo dela?

Vamos aos empregados. Jonas, o copeiro. Deve ter uns 55 anos. Ele viu  ou ouviu alguma coisa! Não engoli aquela história que ficou paralisado com o barulho do tiro! Maria, a cozinheira. Uma bela senhora, ainda bonita. E deve ter sido muito bonita quando jovem. Uns 60 anos, talvez, cabelos já grisalhos. Parece que esconde algo. Ou eu que sou muito influenciável? Para mim, todo mundo tá sempre escondendo algo!  Clotilde, a arrumadeira. Uma mocinha bem apessoada. Muito jovem para o serviço, talvez. Não está gostando nada de ficar presa aqui! Talvez queria sair com o namoradinho.

Enfim, acho que estamos todos acomodados. Podemos começar. Em primeiro lugar, quero que todos falem  o que estavam fazendo na hora em que ouviram o tiro.
___ Mas espera aí! Não era para a polícia fazer essa pergunta? Mais uma vez, Edgar Vilasboas se indignou.
___ Acho que nós combinamos que entregaríamos a solução do caso para a polícia, quando eles chegarem. Ou vamos ficar aqui olhando para a cara uns dos outros durante essas quase duas horas que levará para o jardineiro chegar ao Distrito Policial a pé? Creio que todos concordaram que eu conduziria essa especie de "interrogatório" coletivo. E com nossas deduções, poderíamos entender o que teria ocorrido e entregaríamos a solução pronta para as autoridades policiais!
___ Sim, concordamos com tudo! A sensatez de Cleuza Vilasboas salvou a situação.
Nesse momento, Suzane levanta de seu sofá, um tanto aflita e começa a falar, um tanto esbaforida.
___ Eu não aguento mais! Eu preciso falar tudo o que eu sei!
___ Se acalme, Suzane, você não sabe de nada! Deve estar um pouco nervosa devido à situação, foi um choque pra você! Catarina, providencie um calmante, por favor!
___ Claro, senhor Douglas. Irei providenciar agora mesmo!
Catarina nem teve tempo de se levantar, pois nesse exato momento, as luzes se apagaram. O que foi isso? Ai, alguém pisou o meu pé! Douglas querido, cadê você? Estou aqui, querida, a seu lado! João Vítor, foi você que esbarrou em mim? Quem foi que puxou meu braço? Onde fica o fusível? No final do corredor! Alguém tem um fósforo ou uma lanterna? Há uma ai na gaveta da mesinha, perto da porta! Deixa que eu pego! Rodrigo Serrano acha a lanterna. Consegue acendê-la. Clareia a sala. Vê que todos estão sentados em seus lugares. Passa a luz direcionado o foco para cada um em particular. Estão todos bem? Ilumina o lugar onde deveria estar Suzane Vilasboas.
Mas quando o foco de luz foi direcionado, o que se viu deixou a todos em choque! Suzane Vilasboas estava caída sobre o sofá, com um pequeno punhal enfiado em sua garganta. O sangue começava a jorrar...
___ Meu Deus! Não teve nem tempo de gritar! Disse Jonas o copeiro.
Mas ninguém teve tempo de prestar atenção no que o copeiro , pois nesse exato  momento Maria, a cozinheira solta um grito terrível e cai desmaiada.

                                                                             IV

Mais uma vez, Rodrigo Serrano tomou conta da situação. Afastou todos que estavam próximo do corpo de Suzane Vilasboas. Não deixou ninguém tocá-la. Pediu ajuda a Douglas Vilasboas e juntos levaram o corpo para o escritório de Mr. Rudolf. Agora, na Mansão Sun Way, havia, não um, mas dois corpos trancados, a espera da polícia.
___ Agora, mais do que nunca, sabemos que o assassino está aqui, dentro desta sala. na verdade é um de nós! As palavras de Rodrigo Serrano fizeram todos estremecerem. Por um breve instante, todos se olharam assustados.
___ Eu não posso acreditar nisso! Não acho que alguém aqui teria coragem para isso! O olhar de Cleuza desmentia suas palavras.
___ Ainda acho que foi alguém de fora!  Douglas parecia convicto. Foi uma tentativa de assalto que não deu certo, claro. Meu sogro deve ter reagido de alguma forma. O assaltante disparou a arma e fugiu! Suzane deve ter visto alguma coisa e ele voltou para silenciá-la!
___ A sua história é bem bonitinha, Senhor Douglas, mas não explica todos os pontos! Seu sogro não reagiu! Na verdade ele nem viu quem o matou. O assassino ou a assassina ( pode muito bem ter sido uma mulher) chegou por trás de Mr. Rudolf e atirou com precisão em sua nuca! Em seguida, usou a porta envidraçada para dá a volta pela casa e voltou tranquilamente para dentro se juntando todo preocupado aos outros que seguiam em direção ao escritório. Tudo muito conveniente!
___ E a arma do crime? Ainda está com ele? Cleuza, pela primeira vez, demonstrando um pouco de curiosidade.
___ Com certeza ele ou ela, ao voltar pra dentro de casa, jogou a arma no jardim, ou escondeu a arma em algum lugar.
___ Ora, Senhor Serrano, sua história é que parece absurda! Edgar Vilasboas resolveu dá sua opinião. O assassino, se é que ele exista, não seria tão estúpido. Eu em seu lugar, colocaria a arma em seu lugar.
___Que lugar?
___ Ora, todo mundo sabe que papai tem uma coleção de armas. Está na sala de estar. Dentro do cofre.
___  Eu não sabia disso.D. Catarina, você tem o segredo desse cofre?
___ Tenho sim, senhor! Na verdade, todos sabem a senha! Mr. Rudolf fazia questão de que todos soubessem a senha do cofre. Os filhos o visitam com certa frequência. No cofre há alguns documentos, jóias e outros objetos. De vez em quando, Mr. Rudolf viaja para a Inglaterra e algum dos filhos podem precisar de algo, por isso todos sabem o segredo. Desde que são crianças, isso é algo comum dentro desta casa. Jamais objeto algum desapareceu dali.
___ Muito interessante isso. E a coleção de armas fica ali também/
___ Sim, senhor Serrano. Ficam em uma espécie de caixa. Já as balas ficam em outro cofre, no quarto de Mr. Rudolf. Este sim, só ele e a esposa, sabem o segredo.
___ Quero ver esse cofre e essa famosa coleção!

Rodrigo Serrano acompanhou Catarina e os demais curiosos até o cofre. Ao abrir a caixa, Todos perceberam que uma arma estava faltando. Um dos espaços destinados às armas estava vazio.
___ Está faltando uma! Eram 8 armas pequenas! Catarina estava incrédula. Essas armas pertenceram ao pai de Mr. Rudolf, Senhor Thomas Vilasboas. São armas inglesas do século 19!

Todos voltaram para a biblioteca. O clima agora estava mais intenso e pesado. Rodrigo Serrano agora tinha pouco tempo para a encontrar a verdade. Já fazia uns 40 minutos que o jardineiro tinha saído. Já devia estar bem próximo do Distrito Policial. Logo, a polícia chegaria. Ainda se sentindo o próprio Hercule Poirot, Serrano decidiu que não iria procurar  arma do crime. Para o detetive belga, sair procurando pistas de um lado para o outro, correndo feito um idiota, era perda de tempo. Tudo se baseava nos fatos e no uso das famosa "massa cinzenta". Era possível descobrir a verdade sentado em sua cadeira, apenas refletindo sobre os fatos. Seguindo esse pensamento, ele sugeriu que todos se sentassem em círculo e propôs uma espécie de jogo. Ele faria uma pergunta para cada um. Todos se comprometiam a dizer apenas a verdade. Depois que todos respondessem, ele seria capaz de dizer a verdade sobre os assassinatos. Todos acharam que Rodrigo Serrano era um fanfarrão e resolveram concordar em participar. Por que não? Quero ver esse metido a detetive fazer papel de idiota! Foi o pensamento que passou na cabeça da maioria.
___ Então comecemos nosso jogo! Minha primeira pergunta vai para a Senhora, Tereza Vilasboas. Onde a senhora estava quando ouviu o tiro que matou seu pai?
Eu estava na cozinha. A jarra de água do meu quarto estava vazia, então resolvi descer até a cozinha. Aproveitei e comi alguns biscoitos. Também estava com fome.
___ Senhora Catarina, quem a Senhora viu saindo do quarto de Suzane Vilasboas antes do tiro?
___ Como o Senhor sabe que eu vi alguém saindo do quarto de madame Suzane?
___ Ora, Quando eu entrei pela porta, a senhora ia bem na minha frente e ouvi claramente o que a senhora disse para si mesma : " Eu não acredito que ele estava no quarto de madame Suzane!". Então, quem era?
___ Ora, eu vi o Senhor Douglas...mas tenho certeza de que ele tenha uma explicação bem simples para isso!
___ E tenho! Eu estava ajudando Suzane com a interpretação de alguns documentos. Todos aqui sabem que a inteligência não era o ponto mais forte da esposa de meu sogro!
___ Não seja tão leviano, querido, ela está morta!
___  Não acho que isso a ofendesse, Tereza, querida!
Serrano pareceu não se importar com a conversa entre marido e esposa. Passou os olhos pelos presentes parecendo escolher quem seria o alvo de sua próxima pergunta. Apertou e abriu as mãos e parou os olhos diante da pessoa que parecia ser a escolhida.
___ Minha  pergunta agora  vai para a arrumadeira, Senhorita Clotilde...
___ Para mim? Clotilde pareceu se assustar.
___ Não se assuste, meu bem! O que vou perguntar à senhorita é uma coisa bem simples e tem mais a ver com o caráter de sua profissão e não com você mesma.
___ Eu não estou entendendo, Senhor!
___ As arrumadeiras participam da intimidade de seus patrões e de seus familiares, mesmo que não percebam o quanto.Sabem coisas que nenhum outro empregado sabem. E...
___ Eu não sou uma mexeriqueira, senhor, se é isso que quer insinuar!
___ Calma, senhorita. Não é nada disso! Só digo que as arrumadeiras tem acesso a vida e aos objetos pessoais de seus patrões, por que é ela que arruma e organiza os seus pertences, sua roupa e seus objetos. Por isso só quero saber uma coisa: Alguma vez a senhorita encontrou algo que não deveria está naquele local ou naquele lugar?
___ Agora eu estou entendendo onde o senhor quer chegar... na semana passada eu encontrei as pílulas de estômago, que Mr. Rudolf tomava, no quarto de... De repente, Clotilde percebe que ia falar demais. Disfarça o nervosismo com uma espécie de sorriso sem graça e continua...Se eu não fosse tão distraída, Senhor, eu até poderia te dizer onde vi..., mas acho que isso não tem importância nesse momento...

  Serrano, que de bobo não tinha nada, percebeu quando Clotilde pareceu olhar para o outro lado da sala e para alguém em particular. Querendo dá uma de esperta, não é garota idiota? Claro que você sabe muito bem em quarto de quem você viu as pílulas de Mr. Rudolf. Talvez você queira tirar proveito dessa situação. Tá pensando em fazer chantagem sua idiotazinha? Saiba que isso é muito perigoso...Os pensamentos de Serrano pareceram desaprovar a atitude de Clotilde, que continuava com o sorrisinho no rosto.
___ Tem certeza, Clotilde, que não sabe lembra onde viu as pílulas de Mr. Rudolf ? Porque, veja bem, e prestem bem a atenção todos vocês! Pode ser que essas pílulas tenham sido adulteradas! E se alguém estivesse envenenando Mr. Rudolf deliberadamente?
___ Ma,s isso é um absurdo, Senhor Serrano! Sabemos que foi um tiro que matou meu pai!
___ Sei perfeitamente disso, Senhor Edgar! Mas seu pai pode ter percebido que estava sendo envenenado. Pode ter sido por esse motivo que o levou a  redigir um novo testamento e por isso mesmo teve que ser silenciado!
___ São meras suposições, Senhor Serrano e muito absurdas!
___ Acho que o Senhor lê muitas histórias de detetive, Senhor Serrano! Cleuza disse essas palavras no mesmo tom que uma mãe repreenderia um filho por falar bobagens.
___ Sim, eu leio muitas histórias de detetive! Por isso mesmo eu sei que, se as coisas ocorreram assim, fariam muito mais sentido!
Um certo ar de apreensão tomou conta da biblioteca. Todos se sentiram pouco à vontade com essa afirmação. Dando continuidade ao jogo, Serrano se dirige à cozinheira.
___ Seu Patrão, por acaso, fez alguma queija à senhora sobre o gosto das refeições ultimamente?
___ Olha aqui, seu moço! Cozinho para a família Vilasboas há anos e ninguém nunca fez reclamação alguma sobre o que eu preparo na minha cozinha...
___ Não queria ofendê-la, senhora! O que eu quis dizer foi se seu patrão reclamou de algum gosto novo, ou um tempero diferente nas refeições servidas para ele nos últimos tempos?
___ Nunca reclamou de nada não, seu moço! Ele ultimamente estava tendo azia após as refeições e por isso, eu estava evitando os pratos mais gordurosos e frituras.
___ Claro, claro, daí as pílulas de estômago! Falar nisso, quem as receitou?
___ O velho médico da vila, Dr. Natanael. Já está aposentado, mas sempre abria uma exceção a Mr. Rudolf. Catarina pareceu bastante satisfeita ao dá essa informação.
___ Muito bem, minha pergunta agora vai para o Senhor Douglas!
Não sei se foi impressão, mas Serrano achou que Douglas Vilasboas ficou um tanto apreensivo.
___ O que o senhor estava fazendo, na estrada, escondido atrás de umas árvores, um pouco mais cedo, hoje, quando eu estava vindo pela estrada?
___ Eu não sei do que o senhor está falando! Eu não sai desta casa hoje nem por um minuto! O Senhor deve ter me confundido com outra pessoa!

Quase todos os presentes perceberam que Serrano não acreditou nem um pouco na história de Douglas.
___ Claro, Senhor Douglas, pode ser que eu tenha me enganado...
___ É evidente que se enganou! Como eu disse, não sai de casa hoje!
       Jonas, pareceu que ia dizer alguma coisa, se levantou um tanto ofegante, mas por algum motivo, desistiu e sentou-se novamente.

 Serrano, aproveitou o fato e resolveu que era chegada a hora de fazer uma pergunta ao copeiro.
___ Jonas, você trabalha há muito tempo para a família Vilasboas, não?
___Sim, Senhor! Desde muito jovem! Na verdade, meu pai era o copeiro antes de mim. Foi ele que me ensinou a ser um bom copeiro. Depois que ele morreu, eu assumi seu lugar. E olha que já se passaram 30 anos, Senhor!
___ Por isso mesmo Jonas, tenho certeza de que você será capaz de responder à minha pergunta. Os filhos de Mr. Rudolf vêm visitá-lo com muita frequência?
___ Mas essa pergunta, nós mesmos poderíamos responder, Senhor Serrano! Mais uma vez, Edgar parecia indignado!
___ Mas é claro, Senhor Edgar! Mas eu tenho meus motivos para fazer essa pergunta ao Jonas!
___ Bem Senhor, Os filhos costumam visitá-lo sempre que possível. O senhorzinho Edgar e Tereza sempre foram muitos apegados ao pai. Desde criança. Tereza e seu marido, Douglas costumam vir praticamente todos os fins de semana. Afinal, eles não moram muito longe. Já sinhorzinho Edgar e sua esposa, Cleuza, costumam alternar os finais de semanas.
___ Moramos na capital, Senhor Serrano. E nem sempre os compromissos nos deixam vir como gostaríamos!
___ Entendo perfeitamente, D. Cleuza!
___ Já o senhor João Vítor, esse raramente vem visitar o pai!
___ Eu sou um homem do mundo, Senhor Serrano! Não consigo ficar estacionado em um único lugar por muito tempo!
___ Também entendo seu temperamento, Senhor João Vítor!
___ Sabia que entenderia...
De repente o som de uma moto, vindo de fora, chamou a atenção de todos. Alguns foram até
 a janela para ver quem estava chegando.
___ Será a polícia? Catarina não perdeu a oportunidade para palpitar.
___ Duvido muito! Serrano pareceu convicto.
___ É melhor eu ir lá fora ver o que esse motoqueiro misterioso quer! Vou aproveitar e pedir para ele chamar a polícia no distrito. Sendo assim, a polícia vai chegar um pouquinho mais rápido.
Serrano saiu da biblioteca e fechou a porta. Todos escutaram o barulho da fechadura.
___ O que esse desgraçado acha que tá fazendo? Com que direito ele nos tranca em nossa própria casa? O descontentamento de Edgar Vilasboas foi compartilhado por todos. Vinham reclamações de todos os lados!

 Não demorou muito e novamente todos ouviram o barulho da moto.
___ Parece que está indo embora! Disse João Vítor, que estava mais próximo da janela.

 O barulho da fechadura se abrindo fez todos olharem para a porta novamente. Por ela entra um Serrano todo sorridente, o que não conduzia com a sua postura desde então.
___ Posso saber por que o Senhor está tão feliz, Senhor Serrano? O senhor não tinha o direito e nos trancar aqui, enquanto...
___ Sinto muito, Senhor Edgar Vilasboas, mas eu não preciso mais fazer perguntas, o caso está encerrado!

                                                                          V

___ Como assim, encerrado? O senhor enlouqueceu? disse Edgar incrédulo. Já sabe quem matou meu pai?
___ Já sei de tudo, inclusive, quem estava prestes a cometer um assassinato!
___ Eu não estou entendendo, Senhor Serrano! Já não houve dois assassinatos?
___ Quero que  todos que se sentem, por favor, porque agora eu vou esclarecer todos os fatos! Em primeiro lugar, gostaria de informar a todos os presentes que a casa está cercada pela polícia!
___ Pela polícia! Se tivessem ensaiado não teria saído tão perfeito!
___ Sim, pela polícia! De nada adiantaria alguém fugir daqui! Seria uma perda de tempo!
___ O Senhor fala como se o assassino estivesse entre nós! Com certeza foi alguém de fora que...
—-  Desculpa interrompê-la, D. Tereza, mas não houve assassinato algum! pelo menos até agora!
—- Como não houve assassinato? Não só houve um, mas dois! Edgar foi interrompido por um gesto de mão firme de Serrano, que pediu mais uma vez silêncio. Ordenou que todos continuassem sentados. Pediu para não ser interrompido e começou a falar:
—- Primeiramente, vou me apresentar. Meu nome realmente é Rodrigo Serrano, mas não sou estudante de medicina, como disse. Sou detetive particular. Fui contratado por Mr. Rudolf para descobrir quem o estava envenenando.

As palavras de Serrano atingiram a todos como uma bomba. Ninguém teve coragem sequer de se mexer.
—- Isso mesmo. Alguém estava envenenando Mr. Rudolf deliberadamente. E o veneno estava sendo ministrado dentro das pílulas de estômago. Mas não era fácil descobrir o autor, por isso Mr. Rudolf me contratou. Então, resolvemos bolar um plano para descobrir essa pessoa. Tudo isso que aconteceu hoje aqui faz parte desse plano. Na verdade, eu cheguei a esta casa um pouquinho antes do que disse. Deixei o carro nas imediações e vim a pé. Já sabia que meu contratante estava no escritório. Entrei pela porta envidraçada empunhando a "arma" do crime. Ajudei Mr. Rudolf a "arrumar" a cena que vocês veriam mais tarde  e o ajudei também com a "maquiagem" do falso tiro. Sai novamente pela porta envidraçada. Sabia de antemão que nesse horário todos estavam em seus quartos se preparando para o jantar e dificilmente alguém me veria. Dei a volta novamente  e finalmente cheguei oficialmente à Mansão Sun Way. Antes de me anunciar, eu cheguei até a janela, que Mr. Rudolf tinha deixado previamente aberta, e dei um tiro pra cima! Joguei a arma no jardim e toquei a campainha. Dai em diante, as coisas, como vocês mesmos testemunharam, ocorreram às mil maravilhas! Todos caíram como um patinho! Menos, claro, uma pessoa! Uma pessoa não estava entendendo nada! Vamos chamar por enquanto essa pessoa de X.

 Todos se entreolharam desconfiados. Ninguém ousava se mexer.
___ Isso mesmo, senhores, X estava muito preocupado! Ou preocupada? Quem teria chegado antes dele ou dela e liquidado o velho? O plano era perfeito! Ninguém podia ligar X às pílulas envenenadas! Na verdade, ninguém saberia que Mr. Rudolf tinha sido envenenado! O médico da família que examinaria o corpo era um velho quase sem olfato e cego. Não perceberia nada de anormal. E agora alguém se antecipa e mata Mr. Rudolf com um tiro? Sim, X estava com certeza muito preocupado!  E agora deve estar com muito medo! Ele ou ela pode ainda não acreditar, mas eu já sei quem é X! E a polícia também! Vocês lembram do jardineiro que foi buscar a polícia? Ele na verdade era um policial. Já está a uns dois meses infiltrado aqui, não? É isso mesmo! Já faz um tempo que Mr. Rudolf já desconfiava da existência de X!  Como eu disse, o jardineiro conseguiu a amostra da impressão digital de X após vê-lo manipular o veneno, quando tocou no vidro de remédios. É tão natural o jardineiro está sempre no  jardim e próximo a uma janela...

 Nesse momento, Serrano teve a impressão que alguém na sala se estremeceu...
___ E o motoqueiro misterioso que chegou aqui mais cedo? Também era outro policial. Ele entregou para mim o resultado do exame das digitais de X, levadas mais cedo pelo jardineiro-policial. Esse resultado me fez revelar a identidade de X. Até que esse resultado chegasse, eu tive que inventar aquele joguinho de perguntas. Até que foi bastante útil. Ah, sim, eu tinha quase me esquecido de Dona Suzane. Ela também ajudou muito no nosso teatrinho! Na verdade, ela era atriz antes de se casar com Mr. Rudolf ! Enfim, vamos agora conhecer a identidade do misterioso X! O nome dele está aqui nesse pedaço de papel, que acabei de receber de nosso amigo motoqueiro!  Que é nada mais, nada menso que...
       Serrano não teve tempo de falar o nome de X, pois nesse momento Douglas Vilasboas puxa sua esposa pelo braço e a pega por por trás, empunhando uma faca que ninguém sabe de onde ele tirou.
___ Seu desgraçado! Se alguém se aproximar de mim eu juro que corto o pescoço dessa outra desgraçada!
___ Calma, senhor Douglas, não cometa uma loucura! A casa está cercada por todos os lados! Não tem como o senhor escapar!
___ Eu não sei como esse velho desgraçado descobriu que as pílulas estavam adulteradas! Eu fiz tudo com tanto cuidado! Até pensei em atirar nesse sovina, mas...
___ Sim, eu sei, senhor Douglas, veneno seria muito mais seguro! Por isso mesmo acho que o senhor...

Serrano não pode concluir, pois João Vítor Vilasboas, numa atitude heroica e inesperada consegue puxar o braço de Douglas, livrando sua irmã Tereza da mira da faca. Serrano aproveita a deixa e junto com João Vítor, conseguem dominar o agora desesperado X, sob o olhar perplexo de todos os presentes! E não deu muito tempo e a  casa estava realmente cheia de policiais.
       Já era manhã na Mansão Sun Way. Mr. Rudolf e esposa estavam tomando café na mesinha da sacada.
___ Eu não fui maravilhosa, meu bem? Fingir que tive o pescoço cortado deveria me fazer ganhar um prêmio!
___ E vai ganhar meu docinho, hoje mesmo vamos numa joalheria...
       Enquanto isso, Serrano se despedia na porta de Tereza Vilasboas.
___ Eu sinto muito, Senhora, por seu marido.
___ Será que sente mesmo? Você me tirou a pessoa que eu mais amava na vida!
___ Sinto lhe dizer isso, mas ele não amava a senhora, Casou apenas por dinheiro! Mas agora vai passar algum tempo atrás das grades!
___ Era verdade mesmo que o jardineiro, quer dizer o policial que se fazia passar por jardineiro, conseguiu pegar as digitais de Douglas e...
___ Nem um pouco. Eu inventei tudo! Ele é realmente só um jardineiro! Não tínhamos nenhuma prova! Se não fosse por ele mesmo confessar na frente de várias testemunhas...
___ Quer dizer que até aquele momento, o senhor não sabia de nada?
___ Nem eu, nem Mr. Rudolf sabíamos de coisa alguma! Por isso fizemos aquele teatrinho. E deu certo, o misterioso X se mostrou, do jeito que prevíamos!
___ O senhor é muito diabólico! Eu nunca mais quero ver o senhor na minha frente!
___ Sabe de uma coisa? Tenho a impressão de que a nossos caminhos vão se tornar a se cruzar um dia! Não sei explicar, mas algo me diz que vai ser assim...
___ Que Deus nunca mais permita que eu ponha os olhos no senhor, outra vez!
___ Até a vista, Senhora Tereza Vilasboas!
___ Adeus, Rodrigo Serrano! Até nunca mais!

 Serrano caminhou até o carro, que continuava estacionado em frente à grande Mansão Sun Way. Até que foi divertido esse primeiro caso como detetive. Ele ainda tinha muito que aprender. Também tinha mentido para Mr. Rudolf quando disse que era um detetive de larga experiência. Mas ele se saiu bem não foi? Claro que ele teve um pouco de sorte! Pelo retrovisor, ele ainda viu a bela e triste Tereza Vilasboas em pé, na porta, com seu belo rosto de Madona...Novamente aquela estranha sensação que tornaria encontrar a bela Tereza algum dia. E lá se foi, o agora um pouco mais experiente detetive particular Rodrigo Serrano, seguindo seu caminho pela estrada 14. E agora?Esqueci de perguntar como faço pra pegar a estrada principal!

                                                                     FIM



































































































































































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